Poemas : 

Sorver O Sumo

 
Sorvi o sumo do último
Fruto da cesta.
Reciclei o embrulho
(Após uma sesta)
Embaixo da gameleira
Numa tarde fagueira
De sexta
Feira.

Parei no primeiro parágrafo.
Ponto.
Pronto, dois pontos, pontuei.
Pousei a caneta na orelha
Direita
Levantei os olhos para o teto
Namorei uma palavra
Pois as outras não estavam no chão
Dei nomes feios ao arquiteto
Quando percebi bolor e infiltração
Contei as aranhas uma a uma
Nenhuma cabia na composição
Em suma:
Parei com a pontuação.

Veio a noite em veludoso manto
Eu com as duas mãos no queixo
Usando de artifícios, de um pretexto
Para um poema que não fosse tanto
Que tivesse a forma pequena
Que não causasse espanto
Mas quem ousa pegar da pena
Para entrar neste reino fantástico
Necessita ser um pouco de mágico,
De palhaço, de profeta e de patife.

Não venha me lançar num esquife
Nunca me julgue prepotente
Mas tecer um texto muito exige
De quem ousa passar pelo portal
Onde Cérbero é o constante vigia
Onde Virgílio foi, de Dante, o guia
Onde Orfeu, o encantador de lira
Numa cena que a mim sempre aflige.
Por amor, não resistiu e olhou para trás
Deixando-a no reino de Hades, no Estige.

Numa das cenas que Homero nunca disse
Tampouco o profeta hebreu do longo cajado:
Orfeu com o corpo no Rio Hebro jogado...
Ainda ouve-se sua voz cantando: Eurídice! Eurídice!

Mas aonde é que eu estava mesmo?
Fui escrevendo, escrevendo, a esmo...
Como é difícil manter o foco, o rumo!
No começo do poema eu não falava de sumo?




Gyl Ferrys

 
Autor
Gyl
Autor
 
Texto
Data
Leituras
657
Favoritos
0
Licença
Esta obra está protegida pela licença Creative Commons
6 pontos
4
1
0
Os comentários são de propriedade de seus respectivos autores. Não somos responsáveis pelo seu conteúdo.

Enviado por Tópico
Rogério Beça
Publicado: 12/06/2017 17:14  Atualizado: 17/06/2017 06:20
Usuário desde: 06/11/2007
Localidade:
Mensagens: 2123
 Re: Sorver O Sumo
Ah, patife, patife, malandro
andas a nado no Escamandro,
pois o país não é para velhos
nem para lagos-espelhos,
ou vil metal.
Porque te aprecio neste natal
em que, como fénixes, renascemos,
amaldiçoados vivemos
sobretudo pelo poema, heresia...
os egos e a poesia...


Abraço forte


Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 15/06/2017 16:12  Atualizado: 15/06/2017 16:12
 Re: Sorver O Sumo
Asa palavras sorvem os mais lindos sentidos , lindo poema