Bandos de andorinhas, miríades de abelhas entre flores,
anunciaram o entardecer em plenos dias consagrados pela primavera;
não os percebi, sequer vi os contornos do arco-íris,
formado na abóboda da refração das lágrimas dos olhares amargurados,
exalando aromas sensuais, eflúvios dimanados sobre os alvos lençóis de alcovas furtivas,
tais promíscuos esconderijos onde te homiziavas quando da busca da alma.
Aquele penhor encontraste - salvo engano - por força das sombras de sonhos inexistentes,
imagens e miragens embaçadas de um passado ainda atuante, renitente em se ir.
Arco do céu, manancial inesgotável das mágoas das amantes saudosas,
elas que carregam no olhar a força das alvíssaras advinda das enganosas palavras,
e deixam-se permanecer rodeadas de borboletas, divas apeadas do dorso pelo mesmo vate.
Esta alcova não cede ao menor raio da luz matutina,
na cama fria e solitária entre linhas de seda o sono não vem,
a vigília tensa dando lugar a pensamentos fugidios,
conjecturas sobre destinos e linhas emaranhadas,
conquanto possa haver lá fora multidão de pessoas ao redor,
considero o porquê de entre elas ainda estar tão só.
Bem sei - felizmente ou não, mas bem o sei - que amores não se retomam do passado,
mormente depois de consumidos num incêndio alimentando pelos fluidos do zelo;
também nem se exalta num naufrágio de ilusões alheias a fúria bravia das vagas,
estou constantemente a pensar sobre isso,
e como viver pode não ser mais fácil quando se está sozinha.
Que se deite nas linhas - mesmo tortas - o destino ditando a presença de ti
- a plenitude do amor, o êxtase e a felicidade não atendidas,
essas verei como às luzes na noite escura e trevas em plena luz do dia.
Porém, sempre terei por bom, vez ou outra pensar em alguém,
deixando ledo o pensamento correr rápido, num piscar de olhos,
displicente escrever palavras alheias que jamais seriam as minhas,
mesmo quando nenhuma outra poderia ser a mesma que jamais não fui.