<br />O choque de tecnologia na fachada secular da Estação e os recursos de ultima geração do Museu da Língua Portuguesa, me deixam momentaneamente atônito. Compensado pelos recursos a disposição para desnudar palavras ver-lhe os sentidos, compor frases, uma imensa tela formando o mapa do Brasil em textos, versos.Fico encantado, perco o senso, viajo nas palavras, nas letras, na literatura.Um grupo ouve uma monitora lendo em voz alta textos de Euclides da Cunha escritos em imensos painéis pendurados no teto.Não percebo o motivo para ler um texto visível, mais atento percebo, os olhos mortos dos participantes do grupo, olhando para o lado de onde vinha o som, os movimentos rápidos e sem rumo dos olhos perscrutando a escuridão enorme de sua cegueira.O que me assombra são suas expressões, transmitindo as emoções do texto, cenhos franzidos, sorrisos, tristezas, atenção procurada compreendo que os cegos vêem o que as palavras dizem.Invejoso fixo aqueles olhos sem vida, opacos, nervosos procurando o som que os reporta ao texto, adentro os olhos mortos, sinto a desmedida solidão do vazio negro e começo a ver um ponto de luz que cresce em direção oposta, e mais, e mais de um ponto, a luz me cega penetro no âmago a luz absoluta.E lá estamos eu e o cego, como no texto que a monitora interpreta, irmãos sertanejos sentados numa prancha de madeira nua dentro da Igreja de Canudos ouvindo as palavras delirantes e febris de Antonio Conselheiro.Qualquer dia em São Paulo.
Carlos Said