Volto, às vezes, à serenidade do teu sono.
Não me vês -
fico a ver-te dormir
na escuridão que prolongo além das minhas vestes
e adivinho-te a entrega dócil
ao resvalar da noite já morrente.
O dia acorda devagarinho, sem que suspeites.
É a minha hora, o meu sinal –
as tuas pálpebras não sabem, mas são reposteiros
que dão para o vestíbulo donde te espio
como ave de rapina ao frio madrugar da luz.
O teu corpo desatento espraia-se
alongando o vício do meu prazer.
De súbito, antes que os teus olhos me vejam
escura e funda
o ar frio que transporto
penetra no teu peito despreparado e tenro.
Fissuras abrem-se, engolindo a luz por que acordaste
e, lá fora, um pássaro indistinto
procura o espinho sublimante
do canto que há-de ser.
Os teus cílios agitam-se, como asas condenadas
a tua pele escuta
o teu coração aperta o medo que lhe vem nas veias:
“Será saudade, será tristeza?...”
perguntas-te, à mercê de mim
incógnita e negra
sub-reptícia e alastrante.
“És tu, saudade...?”
perguntas baixinho
estendendo a mão como quem precisa
de um colo de mãe.
E eu não te abraço, só finjo sorrir.
“És tu, tristeza...?”
pedem os teus lábios aos teus olhos secos
como quem estranha os pântanos de sempre.
E eu só avivo a sede que te mata.
Aperto mais um pouco, em gozo de fel
aproximo a Dor, cubro a tua pele
Limpo-te o suor, retraio os meus véus
e nos teus olhos mudos tremem mares e céus
_
“Eu sou a Angústia”
digo-te ao ouvido.
E o dia lá fora
morre com o pássaro
num mesmo gemido.
Teresa Teixeira