[Quando cerro as pálpebras, encerro o mundo.
A chuva alastra-se violentamente do lado de fora. O vento assobia agreste e baila. Puxo os lençóis e tapo o rosto. Está escuro. Tentam falar-me como se existisse. Não os percebo.
Quero ser pó neste lugar. Quero privar o meu corpo de ser transformado em alguma coisa demasiadamente vaga. Quero que a certeza nos (re)encontre e me traga a textura da tua pele como quando usava laços a segurarem-me os caracóis loiros como raios de sol.
Quando cerro as pálpebras, sinto-me a tocar nos teus pulsos. Nunca deixaste de estar comigo neste lugar onde todos os seres respiram. Não há ser que se ame e que não respire! Eu deixo que vivas aqui dentro: onde a respiração ritmada dos nossos corações é visceral vida fugosa que avança sem que a vejamos avançar.
Quando, pela manhã, a luz trespassa os lençóis e me acorda, continuo a sentir-te como se aqui - em mim - estivesses. Os meus sonhos cor de arminho são eternos como quando os teus olhos penetram nos meus olhos e nos olhamos como se nunca mais nos fossemos olhar … até que nos olhamos novamente. Até que nos aproximamos novamente. Peito com peito. Suspiro com suspiro. Pele com pele.
Quando cerro as pálpebras, é como se o mundo me encerrasse no suspiro da Terra que continua, amorosamente, a inventar-nos.]