A de muito que na Corruptela onde a gente vivia Não passava ninguém Nem mascate muleiro Nem anta batizada Nem cachorro de bugre. O dia demorava de uma lesma. Até uma lacraia ondeante atravessava o dia por primeiro do que o sol. E essa lacraia ainda fazia uma estação de recreio no circo das crianças a fim de pular corda. Lembrava a tartaruga de Creonte que quando chegava na outra margem do rio as águas já tinham até criado cabelo. Por isso a gente pensava sempre que o dia de hoje ainda era ontem. A gente se acostumou de enxergar antigamentes.
A poesia de Manoel de Barros (1916-2014), no ano que completaria 100 anos.