Quando aquele homem chegou à cidade, com suas roupas extravagantes, todos, sem exceção, olharam para ele com cara de espanto. Uns mais, outros menos, porem de uma forma ou de outra olharam e pensaram as mais inusitadas situações pelas quais poderia estar passando tal cidadão. Chapéu de couro esverdeado, óculos escuro, um violento bigode, camisa decotada bege, cinto de couro na mesma cor do chapéu, calca marrom e botas longas na cor preta. Assim que saltou na rodoviária, andou cerca de uns trinta quilômetros para encontrar um parente que deveria estar esperando por ele. Mas isto não aconteceu e o nosso homem misterioso, desolado, voltou para a rodoviária e dirigiu-se ao posto telefônico onde tentou em vão falar com o tal parente que supostamente estaria aguardando-o. Não obteve êxito na ligação, sendo assim resolveu fazer um pequeno lanche por ali mesmo e depois seguir a pe, aparentemente sem destino traçado. De súbito veio-lhe uma idéia. Se ele parasse uns minutos para descansar, poderia colocar a mao no bolso e contar quanto de dinheiro ainda tinha. Dito e feito. Era pouco, mas deveria dar para pagar um à pousada simples, fazer uma refeição, em fim, dar a si mesmo um tratamento digno de um ser humano respeitável, porem mal tratado pela vida e pelos problemas pessoais, problemas esses que o levaram para esta viagem delirante.
Logo mais a frente encontrou um pousada com preços convidativos (pelo menos em seus pensamentos), e não hesitou em tocar a campainha do portão de ferro trabalhado em estilo colonial. Uma senhora convidou-o a entrar. Conversaram rapidamente e depois de tudo acertado indicou-o a escada que daria acesso ao segundo andar. Ele subiu os degraus, alguns desgastados pela ma conservação do imóvel e outros quebrados, isto fez com que ele quase caísse – um pequeno susto – que nada significou para um andarilho experiente. Chegando finalmente ao quarto pode primeiramente sentar-se numa cadeira de balanço e descansar por alguns minutos, logo depois tomou um refrescante banho e pôs-se a ler umas anotações pessoais que trazia no bolso da camisa. Fez uma ligeira refeição e deixando o prato em cima da cama dormiu a noite toda.
No dia seguinte, acordou por volta das dez horas da manha, um lindo dia de sol. Arrumou o quarto, que deixara meio em desalinho na noite passada. Vestiu-se e logo depois já estava la em baixo na recepção. Acendeu um cigarro e partiu para a rua em direção uma igreja, que parecia ter sido encontrada de propósito para amainar a sua ira aparentemente sem motivo. No interior da casa de oração ele foi acalmando-se gradativamente, neste momento já conseguia dominar e ordenar seus pensamentos. Mais calmo, bem mais calmo olhou nitidamente para todas as imagens que via em sua frente e às vezes também as que viam no entorno dos olhos. Santos e santas de diferentes tamanhos e formatos davam a ele a impressão que ao sair dali, tudo iria voltar ao normal. Que normal? Mas, realmente de que normal estamos falando? La fora a vida da pacata cidade corria normalmente. Apesar de o tempo e a temperatura já parecia estar mudando, um vento forte soprava em direção à igreja matriz na praça da aclamação. Quando mais tarde, já restabelecido do acontecido ele saiu e caminhando apressadamente voltou à pousada. Em la chegando pensou com sigo mesmo. Passara o dia inteiro e nada de concreto conseguiu fazer porque alem de estar muito tempo envolvido em seus pensamentos introspectivos agora uma forte pressão na cabeça fazia-o desesperar-se novamente. E depois de tomar um chá morno sentou-se na cama de seu quarto e leu mais demoradamente as suas anotações.
Cada novo dia e um recomeço. A esperança de dias melhores sempre deve acompanhar nossos pensamentos para que possamos assim desenvolver dentro de nos mesmo uma positividade que vai nos impulsionar para frente. Somente a determinação pode fazer com que vençamos as lutas que travamos dia-a-dia. Com este dito começamos mais um amanhecer e desta vez nosso herói ou anti-heroi vai partir para a luta e com ele também a vontade de superar os seus traumas e suas desilusões. Deixou a pousada hoje somente na parte da tarde, La pelas três horas e foi ao posto telefônico tentar novamente falar com seu parente. Novamente não conseguiu que a comunicação se completasse. Enquanto não encontrar a pessoa procurada não poderá dar inicio ao seu proposto na cidade. Diante do fato , mais angustia e sofrimento sentia , estava atado a este fato. Ao voltar para a pousada passou pela igreja matriz e resolveu entrar, procurou sentar mais ou menos no mesmo banco do dia anterior e ver e observar as mesmas imagens. Orou com toda a forca que tem em seu interior, meditou, pensou e acalmou seu coração. Saiu um pouco melhor do que entrou, caminhou pela rua até a pousada e agora sim entrou, subiu e ficou sentado na cama pensando em sua vida e no que poderia fazer para encontrar o seu parente e solucionar em parte seu problema. Esta noite, porem, quase não teve sono e não dormiu. Cansado e muito nervoso, ainda tonto procurou o relógio e pode verificar que eram seis horas da manha. Levantou-se cambaleando, tateou a parede ate encontrar a fechadura da porta do banheiro, tomou um banho, bebeu um café simples, vestiu-se como de habito e tentou sair à rua, mas não consegue, chamou a dona da pousada pelo interfone, que de imediato subiu ate o seu quarto e encontrou-o desmaiado em cima da cama.
Quando o medico da cidade chegou, nada mais pode ser feito. Antonio já não mais pertencia ao nosso mundo. Estava aparentemente sóbrio, mas, realmente, ninguém poderia diagnosticar como ele sentiu-se antes do ocorrido. A verdade e que Antonio sofria a alguns anos de refugio na doença^ um mal que significa o fato de o individuo procurar na neurose um meio de escapar aos seus conflitos psíquicos. Esta expressão gozou de grande favor com a difusão da psicanálise, estendendo-se hoje, não apenas ao domínio das neuroses, mas ainda ao das doenças orgânicas em que pode ser posta em evidencia um componente psicológico. O paciente procura evitar uma situação conflitual geradora de tensões e encontra, pela formação de sintomas, uma redução delas.
Dona Carmencita (dona da pousada) providenciou todos os procedimentos necessários para proporcionar ao seu estranho hospede um velório e um enterro digno, deixando transparecer que de há muito o conhecia.
Jose Carlos de Arruda