2ª Guerra Mundial: os soldados brasileiros, antes dos primeiros combates, chegaram, enfim, em Livorno, lugarzinho pacato e aparentemente sem ligação nenhuma com a grande guerra.
Ali, a tropa de combate iria receber novas instruções bélicas, para ataque e defesa.
Os soldados olharam ao redor, apreensivos, sem saber exatamente o que os esperava na linha de frente. Tinha uma base aérea perto da praia, e era um lugar muito lindo, com muitos arvoredos e frutíferas.
Numa certa altura, o capitão parou, observou o batalhão de homens (quase meninos), fez os soldados olharem para um lugar muito grande e plano, e disse:
- Vocês conhecem aquilo ali? É um cemitério. No momento estão sendo abertas as valas para serem depositados os corpos dos soldados que morrem batalhando...
O Capitão fez uma pausa. Olhou, novamente, ao seu redor, e fez quase que uma exigência com sua voz autoritária e tonitroante:
- Vocês são soldados sob o meu comando. Não quero perder nenhum de vocês, entenderam? Aqui, a brincadeira acabou, pois estamos numa guerra onde vale tudo: ou você mata, ou você morre; ou você se suicida...que dá no mesmo. Façam tudo para que os mortos não sejam vocês.
Entre curiosos e temerosos, os soldados observaram o cemitério: Os buracos eram abertos em carreiras, não individuais como nos cemitérios normais. Eram abertas covas que pareciam trincheiras. Haviam muitas cruzes brancas, marcando os lugares onde estavam enterrados muitos corpos de soldados, todos com a devida identificação.
Os rapazes contavam que, cada soldado morto recebia 3 placas metálicas, para identificar em caso de morte: uma placa era colocada na boca do morto, outra na cruz e a terceira ficava de posse do governo.
Enquanto os soldados observavam aquele espetáculo triste e cruel, encostou no cemitério um "doge" espécie de jipe do exército, e dentro do qual havia sacos de cor branca. O batalhão neófito viram que os companheiros do "doge" viraram os sacos, e caíram de dentro corpos de soldados, alguns completamente em carne viva, irreconhecíveis.
O Capitão falou, em alto e bom tom:
- Os mortos são recolhidos e guardados em sacos brancos, até o destino final, que é o cemitério, e depois, quem sabe, o país de origem.
Quando sua voz calou, seguiu-se um silêncio poderoso entre os soldados.
Antes de se situarem dentro da guerra, já havia morrido, neles, a juventude.
Foram-se afastando, devagarinho, ora pensando em acarinhar e honrar aqueles corpos de quase meninos,com uma Oração, ora suplicando para o Deus do seu coração que este jamais fosse o destino de cada um deles.
Os que puderam voltar, até acreditaram que nunca mais veriam um espetáculo tão horrível como esse.
No entanto, na era moderna, os preparativos continuam sendo para guerras. E guerras muito mais poderosas do que aquela.
Só que, no próximo round, não se saberá se existirão corpos suficientes para cobrir os imensos cemitérios abertos ao ar livre.
(Do livro TRIBUTO AO SOLDADO CONHECIDO, da autora).
Saleti Hartmann
Professora/Pedagoga e Poetisa
Cândido Godói-RS