Poemas : 

escultor

 





a voz da pedra para a mão
diz: toma a essência
em curvas de criação

em intima confidência
usa o cinzel
e em vicio, finca no veio
no hábil e ágil magma

na pedra
de fora para dentro
concebe, vastos pomos
seios e ventre cheios
olhos em existir silente
rosa dos ventos
no cabelo

na pedra virgem
esculpe, em assaz desvelo

crava o escopro
em lento amaciar
ama pouco a pouco
a lava, fogo de donzela

abre-a, em espasmo, na pedra
o peito, súbito sangue
fervente, alteia e sonha
a tez inundada

do cru laço da vida
na pedra
armada pela mão, um corpo
uma salaz concubina
adornada a vulcão















Zita Viegas















Dedicado ao amigo Francisco Cogumbreiro, escultor açoreano.
 
Autor
atizviegas68
 
Texto
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Enviado por Tópico
Rogério Beça
Publicado: 24/08/2016 09:19  Atualizado: 24/08/2016 09:19
Usuário desde: 06/11/2007
Localidade:
Mensagens: 2123
 Re: escultor
Ouvi dizer, que não sou escultor, que a pedra é que diz ao artista o que quer ser.

As primeiras três estrofes dão-nos conta disso.

A partir daí, torna-se ambiguo.
Mantém esse teor do fascinio do escultor pela pedra. Mas a pedra sofre transformações.
Torna-se viva e o tom erótico surge cheio de vida e magma.

Como fica belo e excitante.
Gosto deste tipo de escrita inteligente que nos incomoda.

Bj

Enviado por Tópico
Volena
Publicado: 24/08/2016 11:25  Atualizado: 24/08/2016 11:25
Colaborador
Usuário desde: 10/10/2012
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Mensagens: 12485
 Re: escultor P/atizviegas68
Um poema muito sagaz, é natural que um artista ame a sua obra e o seduza! Pois um artista é um idealista sensível. MUITO BONITO! Beijinho Vólena

Enviado por Tópico
Branca
Publicado: 24/08/2016 19:56  Atualizado: 24/08/2016 19:56
Colaborador
Usuário desde: 05/05/2009
Localidade: Brasil
Mensagens: 3024
 Re: escultor
Fantástico teu poema! Pedra e escultor, que ideia genial.

Beijo

Branca

Enviado por Tópico
Ro_
Publicado: 24/08/2016 20:54  Atualizado: 24/08/2016 20:54
Membro de honra
Usuário desde: 25/09/2009
Localidade: Brasil
Mensagens: 3985
 Re: escultor

Que lindo!
Parabéns!
Um beijinho!


*-*

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 27/08/2016 01:27  Atualizado: 27/08/2016 01:27
 Re: escultor
...é indescritível a sensação que causa seu poema. é céu, lua, universo, e também é palavra elaborada com amor e fervor. Favoritíssimo. Parabéns.

Enviado por Tópico
Margô_T
Publicado: 27/08/2016 09:00  Atualizado: 27/08/2016 09:03
Da casa!
Usuário desde: 27/06/2016
Localidade: Lisboa
Mensagens: 308
 Re: escultor
Começamos com a “voz da pedra” que fala para a “mão”, dizendo-lhe o que quer ser, e vamos prosseguindo pelas “curvas da criação” que vão moldando a pedra com movimentos delicados e íntimos, confidenciando com essa matéria em bruto, essa “pedra virgem”.
Todavia, a pouco e pouco, surgem veios na pedra - onde se “finca” o cinzel – e a sua natureza torna-se mais flexível… moldável (“hábil e ágil magma”).
Desbastando “de fora para dentro” concebem-se “vastos pomos”, “seios e ventre cheios” e até “olhos em existir silente” e uma “rosa dos ventos/no cabelo”.
Este “desvelo” e este vínculo que se vai desenvolvendo entre o criador e a sua obra, atinge uma sensualidade ousada em versos como

“crava o escopro
em lento amaciar
ama pouco a pouco
a lava, fogo de donzela”


Onde passámos do magma à “lava” e da “pedra” à “donzela”.
Amando, as mãos do escultor exploram estas formas “em lento amaciar”, "pouco a pouco" - sendo que este “lento amaciar” contrasta manifestamente com o verbo “cravar” do verso anterior, perfazendo um contraste mag(ma)nífico.
Abre-se a pedra “em espasmo” e o “peito”, de súbito, sangra… porque palpita, “fervente”, sublimando-se, passando, assim, a pedra de inorgânica a orgânica, possuindo sonhos e até tez… uma “tez inundada”.
“armada” e amada “pela mão” do escultor, a pedra rompe a sua natureza crua, adornando-se “a vulcão”.

Irresistível encontrar paralelismos deste teu poema com o mito de Pigmalião, de onde destaco este trecho das “Metamorfoses” de Ovídio sobre o mito:

“Ao voltar a casa, logo se abeira da estatueta da sua menina.
Debruçando-se sobre o leito, beijou-a: pareceu-lhe tépida!
De novo aproxima os lábios e toca-lhe nos seios com as mãos.
Ao ser tacteado, o marfim torna-se mole! A rigidez esvai-se,
E sob os dedos cede e molda-se”



Um belo poema escultural.

Enviado por Tópico
Gyl
Publicado: 27/08/2016 13:48  Atualizado: 27/08/2016 13:48
Usuário desde: 07/08/2009
Localidade: Brasil
Mensagens: 16149
 Re: escultor
Artesanato com as palavras que agradam aos olhos. Muito, muito bom. Abraços, Zita!

Enviado por Tópico
MarySSantos
Publicado: 12/09/2016 20:19  Atualizado: 12/09/2016 20:19
Usuário desde: 06/06/2012
Localidade: Macapá/Amapá - Brasil
Mensagens: 5852
 Re: escultor
Não vou dizer muito, Zita, só que favorito.

Bjo


Enviado por Tópico
Juvenal Nunes
Publicado: 27/02/2017 22:12  Atualizado: 27/02/2017 22:12
Membro de honra
Usuário desde: 28/07/2013
Localidade: Douro Litoral
Mensagens: 540
 Re: escultor
Um belo poema de amor como é timbre de todo o ato criativo e, sobretudo, muito original.

Juvenal Nunes