A espera é agora o vale dos aflitos: é um grito da revolta, é a primeira morada da noite a criar enredos na madrugada. O tempo dos enganos, a desaguar na foz dos sentidos, regrados, porém não intimidados pelo soar dos tambores na concomitância dos corpos humedecidos.
Ainda a Primavera consente no seu colo, as águas em rebuliço, e o Outono arruaceiro, no tempo escasso e gelado num ventre seco e amaldiçoado.
O Verão cobre de tons ébrios os sentires dispersos num caminho ainda a percorrer. Tudo é indissociável desse costume onde os sonhos são solicitados à noite, até à exaustão. As vozes afoitas regressam de um vazio sem fundo, afirmando-se detentor do espaço, onde todos dormem no preâmbulo ainda elementar de um pensamento descaído. Gritam às almas em palavras desconexas e desordeiras, sem que o sino saiba os tons certos dessa melodia cavernosa, onde se inspira, mas não se expira, e, sequer se força a pele ao composto químico habitual dos corpos.
A fuga qual corrente esmagada nos abraços fechados, é caluniada pela luz mortiça de um farol abandonado.
O pensamento é agora a peso de ouro, arremessado contra os muros.
Conspurcados os medos pelo filamento das horas incertas, que no relógio, batem livremente, somem-se pela torre em direcção ao céu.
Irremediavelmente se tomam uns e outros, como se fossem pontos certeiros na escuridão. Acostumados à ira dos ventos, consomem-se em rituais consagrados no degredo, onde os espera um Todo inseparável.
Silenciam-se agora.
Tudo é forçado ao abandono, à tirania do tempo que cospe as horas e os segundos, como se tudo fosse um sermão cantado no púlpito das agonias.
Irrefletidos os silêncios desenham figurações abstractas, quando os olhos cegam e os corpos se esfregam num mutismo esbatido na lógica do tempo.
Enfrentam-se os olhares vidrados como se fossem pirilampos no escuro. Só se ouvem os sons trépidos no escoar das horas incertas.
Recolhem-se brisas e aromas de um ventre ainda crescente, como se o Inverno longo dos seus dias, não mais voltasse a ser sombra nos caminhos de Deus.
O Ser supremo, a única divindade que conhecem, é ainda um templo em construção no olhar translúcido, onde o verde se mistura com o vermelho vivo das amoras a dançar como se fossem hóstias ensandecidas nas bocas fechadas.
Tudo é irremediavelmente, o centro convexo de uma ordem contrária onde o Todo se assume a única espera de tudo o que por sorte, nem sempre é a morte.
ÔNIX