TRAVESSIA
Eu de mim comigo
Falo pensando alto.
Mais livremente digo
Tudo quanto persigo
Mesmo tardo e falto.
Sim, porque já não
Tenho luz, senão
A que a lua dá.
Pela escuridão,
Indo lá e cá...
Sim, porque já nada
Senão ir à estrada
Por ver alheio povo
E dar-me à mirada
O novo de novo.
Sim, porque já fora
Pelo mundo afora
Um outro andarilho.
Antes como agora,
Só me maravilho.
Não tenho outro plano
Senão sem engano
Tudo atravessar:
Ponte, monte, cano
Vida, hora, lugar...
Não tenho outra história
Senão a ilusória
D'estar a caminho.
Ir e vir sem glória
À noite, sozinho.
Não tenho outro intento
Senão no momento
Dar mais livre curso
Ao meu pensamento
Me ouvindo o discurso.
E assim, solitário,
Possa ao imaginário
D'outros fazer ver:
Deixe extraordinário
Rastro de viver.
Betim - 07 06 2016
Ubi caritas est vera
Deus ibi est.