Textos : 

O primeiro caderno amarelo - V

 


V

Manhã – uma das abas da tampa da caixa de Paulinho dobrada com a ajuda de mestre Nezinho

Meio-dia nublado. Voltando da casa de meu filho, o grande amor de minha vida. Seu Nezinho ficou aqui vigiando enquanto fui lá deixar o jornal. Comprei uma latinha de goiabada para merendar. Chove um pouco. Seu Nezinho me abre os olhos e a consciência para o perigo de desabamento da laje. Entro em pânico e rezo a Deus que me poupe dessa tragédia desse sofrimento. Mas Senhor há de me ajudar – basta também usar a cabeça. Seu Nezinho espera Seu Bine, o meu vizinho para lavar o carro. Apertei “unzinho” e vou para casa de maman almoçar.



Tarde nublada –



Almocei uma mistureba de bifes de ontem e os retemperei ao meu gosto. Minha cunhada dormita e ronca deitada no sofá da sala. Clarinha ao lado. Larissa almoça, chegou ainda pouco do colégio – Uma menina interessante, inteligente e etc tal – Professor, meu irmão mais velho deitado assistindo SKI.

- Ai que frio! – Exclama minha cunhada após uma lufada de vento que penetrou na sala. Maman deitada na rede com a janela fechada. Sarinha no computador. Bruce o jovem cão deitado e acorrentado no canto da porta. Devo confessar que a leitura diária de meus diários me fizeram muito bem e me inspiraram a voltar a escrever como antigamente, uma obrigação. Releio Joyce ,as também leio “Je reste un Barbare” – Sarinha fala ao celular com alguma amiga de seu circulo de amizade do salão. O céu nublado – Chuvisca sobre o telhado que a Promotora Doutora Araceles Gatinhos mandou fazer em honra a minha amada mãe – trocaram a Brasilit pela telha comum de bairro.

Estou um pouco cansado e preocupado com o que Seu Nezinho me disse a respeito das rachaduras da oficina. Vou deitar-me no sofázinho e ler um pouco.

Começo da noite - As luzes dos postes são acesas. Clarinha brinca com umas folhas de papel.

- Para, tá doida" - grita minha cunhada da cozinha. Tenor e Larissa na sala do computador. Irei banhar-me e envergar a minha farda da noite e sair para a minha ronda tradicional. Seu Carlos, o valet de Professor entra todo garboso e vai direto ao quarto do casal. Leio Joyce.

Larissa chama mamãe para jantar. Sarinha goma as roupas dela e do esposo para irem juntos com Larissa para a reunião no Salão das Testemunhas de Jeová. Minha incansavel cunhada assa uma carne para Professor no fogareiro lá no quintal.

De volta ao aconchego do lar dos Bambas. Professor anda pela cozinha. Clarinha canta um antigo sucesso do saudoso Evaldo Braga cantor efêmero dos anos 70. Mamãe deitada e enrolada na rede no quarto. Minha Cunhada poe-o seu tricô sobre o braço do sofá, levanta-se e vai para a cozinha preparar as merendas de Clarinha e de mamãe. Quando cheguei na Praça não encontrei ninguém, então pus a ler Joyce sentado no banco dos papudinhos e aos poucos eles foram chegando devagar. Primeiro Alan "ligado", dois dias no ar, seguido por Gato, Seu João da Cruz - inteirei com um real para comprar uma garrafa de pinga que Gato foi compra-lo no finado Bispo. Deu-me duas moedas de um real e dei-lhe uma cédula de cinco reais.

- Traz o meu troco - advertir-lhe.

Começou o Jornal Nacional. Seu Riba foi o ultimo. Mas senti falta mesmo foi da figura carismática do pequeno Matraca.. As sete e dez desci para a oficina, mas com aquela que é o meu eterno pesadelo, o perigo da mesma desabar - Mas Deus é bom. Apertei "unzinho" no fundo tranquilo e isolado de tudo. São as minhas eternas preocupações: mamãe, meu filho e a oficina.

- Toma logo, Dona Engracia - Ordena minha cunhada para mamãe que não quer merendar - Enquanto esta morno.

Na volta o clube estava desfeito, apenas Alan em pé perto do banco olhando alhures com os olhos vítreos. A barraca de Dona Gloria aberto com as cadeiras e as mesmas espalhadas na calçada da praça. Larissa chega da reunião e vai direto para a sala do computador, onde também repousa meus amigos e conselheiros literários. Confesso que estou levando uma vida tranquila, mas se não fosse esse pesadelo, seria melhor. As vezes fico tenso com uma lebre, a espera de alguma coisa negativa. Gostei desse caderno de capa dura amarela que estou usando é o inicio de uma nova era, a volta do poeta a sua simplicidade, escrevendo no seu idioma. A Internet não tem mas aquele fascínio que vivi alguns anos atrás quando comecei postar os meus poemas num francês macarrônico. Depois que publiquei meu livro na França, perdi o gosto - Todas as noites ainda vou a lan-house, mas apenas para ouvir uma boa musica de Mozart, Chopin - ainda pouco ouvia a nata do jazz Colle Porter, Charles Parker e Dizzy Gillespsie - os tempos das paqueras virtuais, que passei a fazer depois que madame Rameaux rompeu bruscamente a nossa relação de três anos, me trocando por um baixinho motoqueiro, quase me deixou louco, chorava que nem um bezerro desmamado na solidão da oficina enquanto apertava uns baseados para amenizar o meu sofrimento inesperado, pensava em tanta besteiras, mas graças as salas de bate-papo e o MSN conseguir superar esse trauma, encontrei mulheres bacanas, mas que infelizmente não deram certo. Até pensei ter encontrado a companheira certa, o meu terceiro amor, a poetisa Mad, um mês depois me despachou. Minha cunhada coloca as cadeiras sobre o sofá e senta na sua cadeira de plastico, pega no tricô e começa a sua terapia. Mama Grande geme baixinho do quarto deitada. Fumei um 'carêta" depois de saborear um ovo frito com farinha seca e um café com leite doado pela Prefeitura que minha cunhada ganhou do colégio em frente onde Clarinha estuda - onde Raimundinho, Larissa e Daniel também estudaram. Uma semana e um dia sem álcool. Comi dois pedaços de bolo que Larissinha guardou para mim. Ela esta no seu quarto vendo televisão. Professor ronca, minha cunhada tricota enquanto ver a novela. A preocupação latente com a oficina - mas confio em Deus e sei que ele vai me ajudar de uma maneira ou outra, assim como sempre me ajudou nos momentos mas dificieis que passei, Já até perdi a esperança de ver meu livro que nunca chega. A novela termina, mudo de canal. Preocupado coma a missão de amanhã, dobrar as laterais da tampa de Paulinho. Um motor de caminhão é ligado, vou acender e fumar mais um 'carêta' que comprei para minha cunhada. Desligo a televisão e apago a luz e vou para o quarto de mamãe me deitar e tentar dormir. Obrigado Senhor por mais um dia maravilhoso.

trecho do livro "Enquanto Escrevo" do Clube de Autores (www.clubedeautores.com.br)




 
Autor
r.n.rodrigues
 
Texto
Data
Leituras
680
Favoritos
0
Licença
Esta obra está protegida pela licença Creative Commons
3 pontos
1
1
0
Os comentários são de propriedade de seus respectivos autores. Não somos responsáveis pelo seu conteúdo.

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 06/06/2016 10:33  Atualizado: 06/06/2016 10:33
 Re: O primeiro caderno amarelo - V
Belo relato do poeta em busca da sua arte, entre anseios e receios, balanços de amor, família e amizade.

Abraço