Quisesses tu sossegar os meus ventos, acalmar as minhas marés altas
apagar esse incêndio que faz arder o meu peito e a alma
ou porventura viesses com essa serenidade que já me serenou
dando-me o teu tempo, o teu abraço, o teu olhar, a tua mão
Quisesses tu mostrar-te ao mundo como nuvem que se esvai no céu,
assumindo de vez esse brilho dos teus olhos, iluminando as noites
ou ave branca que voa livremente no céu sem receios ou temores das tempestades
chegando em mim, como porto de abrigo, onde descansasses esses medos
Quisesses tu colar a tua sombra à minha, o teu calor ao meu,
misturando o teu perfume na minha pele, nas calçadas que percorremos
correndo em areias molhadas, comendo nas vielas castanhas assadas
cantando canções de amor sem vergonha dos olhares curiosos e alegres
Quisesses tu despir esse tenebroso pavor de caminhares a meu lado
essa agoniante vontade de entrar num lugar escondido
para me roubares o beijo que quero mostrar ao mundo
saboreando o teu bâton, morangueiro ou mentol
Quisesses tu, por uma hora, ser a metade de mim
despidos de conceitos ou preconceitos,
navegantes em praias já sonhadas e dormidas
embalos de mares nocturnos
arrepios de frio quente
Quisesses tu mostrar a tua coroa,
seria eu rei, senhor, dando-te o meu reino
fazendo-me teu pajem ou defensor
das guerras que temes sejam inventadas
Quisesse eu não te querer tanto
como quero à própria vida que canto
em palcos de onde te vislumbro
e de onde não te posso enviar esse beijo
que sei é teu permanente desejo.
Quisesse eu não querer ver-te chegar ao camarim
com um ramo de beijos nos lábios e mil beijos em flores.
Quiséssemos nós ser o que afinal somos assumidamente em segredo
não temeria largar esse meu receio de teres vivo o teu medo
de seres os ramos onde poiso,
o mar em que navego
os lábios que eu beijo
ou o amor que eu amo!
Delfim Peixoto © ®