Pendurado num cigarro vagueante
Na calçada iluminada pelo sol
Calcorreio em passos lentos meditantes
Escutando da fria brisa lembranças e memórias
Trazidas em embrulhos coloridos
Como os balões que fogem das mãos das crianças
Nas montras de vidro o reflexo de mim
Não permitindo vislumbrar os artigos expostos
Cuidadosamente colocados para chamarem a atenção
Obrigando-me a prosseguir colado à sombra que me segura
Sem qualquer direção definida ou escolhida
Chegado a um banco de madeira sento-me
Não pelo cansaço ou sequer pela curiosidade
De noutras sombras me rever
Antes pela vontade de ver o Passado
Desse jardim antes vivido e respirado
Conta-me esse variado colorido
As tardes soalheiras cantadas,
Os ritmos compassados de passos descansados,
As forças de lutar, juntas as vozes numa voz,
Reerguendo o corpo relaxado em decidida decisão
De desse jardim perfumado pelas flores ser guardião
E já das sombras se levantam outras faces,
Erguem-se os braços em entrelaços,
Punhos cerrados numa canção,
Decididamente em escolhida direcção
Para aos abutres fazer frente,
Gritando vorazmente o NÃO
Qual rugido de leão,
Levantando ainda mais a voz
Dizendo BASTA!
Segurando um cigarro
Retomo o caminho de regresso
Não deixando o fumo tapar-me a visão
Calcando as podres folhas ainda inertes
Sentindo na brisa agora morna
O refrão do coro das Primaveras
Cantadas pelo Povo da minha Nação
Delfim Peixoto © ®