O JOVEM VIÚVO Katchengo foi deixar o seu primogênito no jardim de infância. A sua jovem esposa morrera, depois que retiraram o feto morto de três dias. Ele chorou copiosamente a perda repentina de sua cara metade. Uma melancolia tomou conta de mim, da minha solidão sem nenhuma companheira para chamar de 'minha', só me resta escrever para extravasar os meus recônditos sentimentos. As ideias embaralham-se febrilmente e não consigo organiza-las e coloca-las no papel. Hesito que escrever. São uma miscelânea de ideias. Há momentos que quero digitar a continuação sequencial dos cadernos, ainda pouco ocorreu-me outra versão, digitar e formatar os primeiros diários - Diários de uma Existência - Desterro - 1985 a 1989 ou uma antologia poética. Fazer alguma coisa. Como sei que não venderei nada, o escolhido foi Diário de uma Existência para amaciar meu ego, voltar no tempo.
Digitei algumas folhas, mas a euforia passou e chegou a depressão resolvo não digitar nada, seria pura perda de tempo, sou um idiota mesmo e não adianta querer provar ao contrario. È melhor ficar agachado no meu cantinho em algum lugar dentro de mim até essa tempestade sentimental passar. Para combater as minhas neuras, leio Dostoievski, o bom Dostoievski e seus enigmáticos personagens a beira da loucura andando a esmo pelas ruas e beco de Petersburgo a beira do Nieva ou na Avenida Nievski. A bem descrita a ultima noite do pilantra do Svidrigailov no hotel de terceira co o recepcionista maltrapilho e os pesadelos e por ultimo o suicido - a ironia do mestre - em frente ao quartel de bombeiro, o olhar amedrontado de Ulisses, a sentinela judeu. Adoro esse capitulo assim como as exéquias no quarto da viúva Catierina - pérolas do mestre. O barulho do ventilador no quarto as escuras de Larissa, o casal dormindo e roncando. Seu Pietro deitado no sofá brincando ao celular, os mosquitos enjoados - eu concluindo a leitura dessa obra-prima "Crime e castigo" - reponho no seu devido lugar ao lado de outros livros de seus conterrâneos. Ainda lendo Allen, mas também Balzac, Kerouac e esporadicamente Miller - vou deletar o que digitei - os diários ainda não são legais, achei-os muito enjoados.
O CÉU NUBLADO, clima ameno uma ameaça de chuva. Ainda não cortaram a energia elétrica. Sonhei com Roskolnikof e Sonia. A mente embaralha tudo - saudade de quando quase todas asa semanas eu tinha serviço ganhava os meus trocados e comprava os meus adoráveis livros. Há seis meses que minha vida virou bruscamente. Meu vizinho tira o carro da garagem. O mototaxista Troira ou Dr. Oswaldo aposentado pelo Tribunal de Justiça para e estaciona em frente a porta e desce para conversar um pouco.. Soldei um pé de uma cadeira que Mozaniel trouxe. De Dostoievski para Balzac. das ruas de Petersburgo para as luxuosos salões de Paris - o mundo maravilhoso que esse magníficos homens superinteligentes escreveram. Nunca chegarei aos pés deles, sou muito obtuso - por mais que me esforce, que leio e releio sem cessar jamais serei um deles - mas farei o que sei, não sou pior e nem melhor, sou apenas um teimoso. Leio alguns trechos de "Diário de Uma Existência" na busca de um bom texto para compor o próximo
livro - deletei o que já tinha digitado.
LEVANTEI-ME AS CINCO e cinquenta e cinco para urinar, mas antes abrir as folhas da janela, ingerir os quatros comprimidos diários, enchi o litro na torneira e o coloquei no congelador. Retornei para o quarto, apanhei a biografia de Allen li algumas paginas, mas a vontade de ler os diários de 85 foi maior, encontrar textos para formar um mosaico. Depois de ficar alguns minutos em pé na fila da Casa Lotérica na Avenida dos Portugueses para fazer um fezinha para sair desse sufoco financeiro. Uma cena abalou8-me profundamente e que chamou-me a minha atenção para aquele triste quadro. Uma jovem mãe com um bebê nos braços, a sacolinha no ombro, segurando uma bandeira de um candidato qualquer debaixo daquele sol inclemente na beira da calçada. Deu-me pena - deprimente demais. Doeu-me demais, necessidade daquela jovem mãe, assim com as suas companheiras ganharem míseros vinte e cinco reais por dia, ainda correndo o risco de um calote, de serem engabeladas pelo agenciador. Como seria a vida daquela sofrida mãe para submeter-se a essa tortura degradante e ainda mais com seu pequeno e inocente rebento. Solteira? Tento traçar um perfil pra aquela jovem triste, mas não consigo, ainda estou abalado emocionalmente. Uma Serviço-Geral passa com um livro nas mãos, um exemplar de "Esperança" de um pastor da Igreja Adventista. O corredor, pouco pacientes aguardando vez. Dona Dalva a enfermeira que acompanha o meu tratamento, passou no concurso do Inamps e breve começará a trabalhar. Ela tem outro objetivo entrar na Faculdade de Medicina. O cheiro forte dos desinfetante, as auxiliares de serviço geral lutam bravamente para higienizar o banheiro dos funcionários. No ar o odor da comida preparada no restaurante. Tento me convencer a digitar o inicio de "Notas de uma Prisão federal de Segurança Máxima" onde um pistoleiro relata a sua historia isolado numa cela, sem contacto com ninguém reflete sobre a sua vida e seus crimes, baseados em alguns depoimentos. Ele é um jovem de 25 anos que executou mais de trinta homicídios. A primeira morte aos dezesseis anos para vingar a do avó morto por um vizinho ladrão de galinha. As doze anos mudou-se com a mãe para São Luis, durante esses quatros anos monitorou o assassino de seu avó até encontrar um local perfeito na Feirinha, onde o mesmo passava todas as tardes quando vinha do serviço. A estória baseia-se em varias que ouvir de Seu Carlos Magno, o ultimo dos pistoleiros vivo, remanescente da era de ouro da pistolagem. O que falta para mim é persistência, sei que tenho capacidade, a desgraça dele começou numa fria noite, quase perto da meia-noite, executou um jornalista num bar da Avenida Litorânea. Para ele era apenas mais um que merecia morrer por vim chantageando um grupo de agiotas que negociava com prefeitos. Não sabendo que a morte daquele sujeito levaria a sua prisão e dai a sua condenação. Três bons livros apanhei na biblioteca itinerante. Conversava com Joãozinho mecânico no canto da delegacia, quando vi o veiculo contornando a esquina.. Salman Rushdie e o polêmico "Versos Satânicos" que quase custava-lhe a vida; Gabriel Garcia Marquez, o grande colombiano de Arataca e os seus saborosos "Doze Contos Peregrinos" e o mestre português Saramago "Historia do Cerco de Lisboa - ambos premio nobeis - comecei por Rushdie que nunca havia lida antes e achei interessante, assim como o primeiro conto de Marquez "Bom Dia, Presidente". Os contos dele abriram os portões de novas concepções literárias. Por que também não escrever contos, são mais rápidos.