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TURBECULOSE V

 
V

Três meses e duas semanas sem beber cachaça. Venho tomar um banho de sol, em vez de andar atoa, espalhando bacilos. Dostoievski adorava-o.
- Vai para onde? Pra a oficina? - pergunta a matriarca com a vassoura na mão varrendo o canto da sala por trás da porta.
- Não, vou tomar um banho de sol. - Então lembro-me do grande filosofo, adepto do cinismo, Diógenes de Abdera deitado no seu barril e Alexandre, o Grande vai visita-lo, interpondo entre ele e o sol.
- Sai da minha frente - disse asperamente para o Grande, não intimidando-se.
Os gatos em bandos agitados - uma delas no cio deita-se no chão virando-se de uma lado para outro. Juanito, colega de Sara do Salão sentado na borda da calçada, esperando os outros companheiros para mais um dia de campo, evangelizar os gentios. A bomba funcionando. O odor forte de café moído na hora que vem da Casa dos Correias.
Depois de uma boa hora de banho de sol, recolho-me. O patriarca e o factotum assistindo a tv nova.
- Professor puro, puro! - Saudou-me Seu Jailson Pé-de-Pato que subia a ladeira devagar acompanhado por um casal de cães para mais um dia de labuta e de cachaça. Depois foi Mariano, o carreiro maneta sentado no varal da carroça. Eu lia o caderno verde.
Um doidão passou gritando no meio da rua, pensei que era o meu amigo, grande mecânico Sarney,levanto-me da cama e olho através da grade e constato que não era ele. Na porta do Pm em frente um casal conversa.
Encerrei a leitura do "Caderno Azul" como me doí não pode-lo digita-lo e transforma-lo num livro. Gostei dele, pensei em pedir ao Patriarca autorização para digita-lo, mas imediatamente refutei a ideia. deixa esta com está. Levanto-me, apanho o copo e a colher vou para a sala de jantar - é hora do suco puro que Seu Pietro preparou ontem a tarde. Os oito gatos sentados de pescoço duro observando a matriarca cortando a carne sobre a pia. Abro a geladeira, apanho o litro e açucareiro.
- UI, mamãe! - espanta-se a Matriarca - esses gatos ainda vão me derrubar.
Retorno ao quarto
- Raimundo, tá parecendo Seu Benedito, só pele e osso - Falou a Matriarca humoristicamente. Professor chegou cedo. Tia redonda ainda pouco. datilografei duas folhas, agora vou descansar. A irmão de Seu Pietro trouxe a bomba d'agua.
Almocei bem, um cozidão de carne com verdura, tentei cochilar, mais não conseguir, fiquei pensando quimeras , tipo que meu livro vendera 10 mil exemplares e recebi um cheque no valor de dez mil reais. - Na lista de best-seller das revistas. Entrevistas. Enfim o sonho de todo o escritor, viver daquilo que escreve. Um contrato com uma grande editora. Na França, o sucesso também chega. Coisas impossíveis de acontecer, mas possível de ocorrer. O mundo dar muitas voltas. Seu Pietro pega a farinheira e se enfurna no quarto de Larissa para comer não sei o que, mas deixa pra lá, o Patriarca viu e não disse nada, quem sou eu para dizer alguma coisa. O deficiente físico com suas muletas sobe a ladeira, vindo da 'bocada'. Encho o meu litro com água do filtro. Um céu límpido, os murmúrios das televisões. O barulho típico de um monomotor rasga o silencio. Deito-me para ler Tolstoi. O capitulo emocionante que conta a morte por tuberculose do irmão de Lievin, num quarto de um hotel sórdido. O trabalho incansável da cunhada consolando e auxiliando o enfermo nos estertores da morte. Creio-0me que me vi. a magreza, tosse renitente e a minha cunhada laboriosa cuidando de mim.

Hora do crepúsculo. Um ventinho fresco açoita lentamente os galhos da romã. Professor chega da caminhada vespertina. A Matriarca em pé na beira do fogão preparando uma suculenta sopa. banhei-me e vestir a farda para sair, vim sentar-me no terraço. Assim fiz pela manhã, vou evitar sair. Sinto-me deprimido, como se as pessoas estivessem olhando-me e comentando entre si:
- Não é aquele que estar tuberculoso? Oh! Como ele estar magro!
O deficiente físico das muletas saúda-me do meio da rua descendo. Os bem-te-vis dão os últimos gorjeios antes de recolherem-se aos seus ninhos. Ainda pouco fiquei emocionado e as lágrimas vieram aos olhos na cena da despedida do pequeno filho de Ana Karenina, o Seriorja de noves anos. Mexeu muito meus sentimentos, fazendo-me lembrar da situação que vivi, quando me separei de meu filho. Como era doloroso vê-lo e não pode-lo ficar ao lado dele. Uma família rasgada, com certa vez nos encontramos casualmente dentro do ônibus, inocente fardado veio até a mim, sentou-se ao meu lado e ficamos conversamos. Como aquilo doía no meu coração, nunca imaginei numa situação daquela,separado do ser que mais amo, ele tão inocente - mas entendeu a situação, mas não deixava transparecer. Um gato tenta invadi os nossos domínios, atrás de uma das gatas no cio e Bruce o Cão ao vê-lo latiu. Larissa fechou a porta. O barulho do serrote do vizinho surdo-mudo no seu estreito atelier.


 
Autor
r.n.rodrigues
 
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