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RicardoC | Publicado: 02/12/2015 13:55 Atualizado: 02/12/2015 14:01 |
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Re: Do mar ao rio
Passei para ler teu poema, Betha, atraído pela palavra cunhã, da qual gosto muito.
Pode soar algo superficial, mas eu sou assim mesmo: Amante de palavras e seus significados. Sobre teu sonetilho, penso que ficou misterioso e hermético. Talvez uma nota do autor favorecesse a interpretação dessa personagem que "foi santa e deusa pagã". Pareceu-me se tratar de Santa Iria, cujo culto se confundiu com o da deusa Nabia na costa ocidental da península Ibérica, a senhora dos rios e das águas. O "mar feito rio/onde canta a cunhã" parece remeter ao Rio Solimões pelo uso da tão cara palavra cunhã, que é regionalismo do Baixo Amazonas. Todavia, em função da história da deusa Nabia, pode ser a própria desembocadura do Tejo ou dalgum rio do norte de Portugal cuja toponímia guarda a memória do nome da deusa: rios como sucede com o Navia, na Galiza e o Neiva e o Nabão em Portugal. Quem seria o "mor fã" da deusa-santa? A cunhã que canta as coisas do rio-mar? Mas essa, com o perdão da ousadia, eu julgo corresponder à própria poetisa... Resta um homem-fã -- talvez mais corretamente "fiel" -- que à luz de vela e pavio lhe rende culto. A "diva cruel sem elã" parece ser a cunhã-cantora. Faz lembrar, todavia, a passagem da atriz francesa Sarah Bernadette pela ópera de Manaus no início do século passado -- ela sim, cognominada "Diva!" ou "Divina". Com certeza ela teve um alienista com divã e tudo! A imagem final é ainda mais misteriosa: "todo mar é agora um rio!". Pode nos remeter às mares que permitem oscilar o nível de água doce junto a foz dos grandes rios, fazendo com que estes avancem mar adentro, tal como acontece como próprio Amazonas, o Rio da Prata e, atual e infelizmente, com o Rio Doce cuja lama tóxica ora se espalha pelo Atlântico Sul... Ver um mar tornar-se rio é algo, como se vê, raro e apenas possível em escala humana, pois, o mar continua sendo grande extensão de água salgada, apesar dos eventuais avanços da água doce e turva. Talvez a história de Santa Iria tenha algo que desconheça sobre mares virarem rios. De facto, esse seria um milagre à altura de uma grande santa. Enfim, as figuras femininas -- cunhã-cantora / Santa Iria / Deusa Nabia / Diva (seja Sarah ou não) -- se superpõem na figura da poetisa que versa diante de um grande rio-quase-mar. Acho que é isso. Abraços, RicardoC. |
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