Ode à mamãe - Tua Lembrança
“ No fundo, todos temos necessidade de dizer quem somos e o que é que estamos a fazer e a necessidade de deixar algo feito, porque esta vida não é eterna e deixar coisas feitas pode ser uma forma de eternidade. ” (José Saramago)
Uma terna lembrança na tarde
Cruza meu caminho, passam nuvens
Gaivotas são pensamentos errantes,
Gravitam na mente do filho distante,
Náufrago sou dos próprios sonhos
De conquista, em lugares estranhos
Urge tocar a terra firme, oh bússola
Alcances a minha nau-materna...
As ondas agitam as marés,
Nada do farol, só sinalizadores
O luar se recolhe, está encoberto,
Nuvens de tempestade no porto
Na turbulenta e sombria noite
Tua cantiga do sol ouço ao longe
No ritual da queima dos ramos
Para acalmar a mente e os trovões
Ali, longe da terra, sem raízes,
Um toque terno e sublime
Como um leve soluçar no frio
No balanço que a noite trouxe
Na amargura desértica,
Brota uma esperança,
Eis que tua mão me enlaça
E envolve (de novo) a criança
Sofres, mas ainda ninas,
Sonhas, pensas, oras
Acalantas ainda tuas crias
Procuras nas cestas, redes...
Nos berços que o tempo célere
Tomou em um tapete árabe,
Mas jamais será apagada, esquecida
Aquela chama que acende (u) tua vida
Que tu já não percebes eterna criança
Que sopraram as velas do sono
E apenas a tua canção de esperança
Segue através da noite mar adentro...
AjAraujo, o poeta humanista, escrito em homenagem a minha querida mãe Eutália, nos tempos da faculdade de Medicina, em Setembro de 1979 (revisitado em 2015).
Imagem: Farol em Maine, EUA.