Fui uma amante à moda antiga, daquelas que esperavam o encontro na mais secreta religiosidade das horas adormecidas na tarde alinhavada de impaciente espera. Aprendi a esperar como quem tem dos dias o bastidor de bordados instantes a ponto de cruz e minutos de prece urdidos na teia do tear da ilusão. Talvez a manta de retalhos de uma vida antiga a cobrir e a aconchegar toda a alcova.
Esperei alguns anos até que fosse decidido que tempo se encurtasse entre nós e houvesse mais do que palavras trocadas em pequenos bilhetes com asas nos pés do moço de recados. Palavras que faziam corar o anjo mais rebelde, surpreendido pelo amanhecer arrebatado de tocadores de trompete irradiando luz sobre os desejos escritos em azul celestial numa nuvem derramada sobre as minhas mãos trémulas.
Chegavas com hora marcada como se o tempo tivesse parado a vida para esse encontro passional.
Sozinha esperava-te como quem espera ser alimentada numa gaiola prisioneira de virtudes e castidades dos anos que passam cativeiros de luxuria e pecadilhos de uma dama apaixonada pelo lado errado da vida.
Chegavas e mordias no lábio inferior o silêncio ferido que como um bisturi, rasgavas todas as lágrimas incubadas na minha solidão. Despias a tua vida pelo chão e de nudez carregada de desejo tomavas de assalto o corpo que amanhecia a esperar-te pulsante de paixão aprendida nos teus lábios quase cerrados. E sabia assim que esses encontros não eram mais do que mera satisfação do ímpeto sexual que agita excitação na guerra por vencer dos amantes fortuitos em escassos momentos furtivos e esquivos.
Era na tua boca que sentia o vazio e a ignorância acesa da frieza do teu corpo e não nos gestos travados de loucura rompendo a pele de gozo e luxúria apoderando-se de cada orgasmo fruído de satisfação.
Os olhos, nunca os vi.
As mãos, senti as como desfiladeiros vertiginosos esfacelando o prazer na frialdade dos gemidos incutidos no lábio negado a tantos beijos.
Eram umas quatro horas gastas sobre o leito de uma cama que não nos pertencia e paga com moedas de silêncio de uma vida inteira, como se rameira tivesse sido escolhida no catálogo das oferecidas em esquina alheia aos olhares do pudor. Entre quatro paredes, soltavas de ti o súbdito entregue entre coxas escancaradas por escassos segundos era a prece redentora de todas as orações prestadas ao culto da mulher.
Logo ali, do outro lado de fora do quarto pago à hora, havia a tua vida antiga esperando-te recheada de família, amigos, trabalho e outros tantos afazeres que dominam o teu lado humano e ordinário na afectividade compromissada de homem casado.
E eu, paciente impaciente levo a vida a esperar-te os beijos frios e distantes húmidos de sentidos e vazios de entrega. Dizias-me sem palavras que eu tinha uma santa paciência em te aturar.
Adoeço esperando a cura que nunca terei porque amadureci erradamente flor sem pétalas numa primavera tardia.
Já é inverno e os dias sombrios encurtam as horas a esperar-te.
Assino Tura