Não sou deste reino
Não sou deste mundo
O cavalo que me deram
Devolvi-o à liberdade
Sigo a estrada incerta
Deserta
Nada tenho
Nada sou
Troco-me por mim próprio
Troco-me sem valor algum
Dos sonhos que julguei sonhar
Todos me foram arredios
Eram já de outrem
Os sonhos por mim tentados
Pintei plágios
Nas noites de dormir
Se ousei chamar-lhes sonhos
Logo recusei a sua posse
Era pequeno o mundo
E todos os reinos
Coisas menores
Na minha sede de conquista
Até o meu amor
Reclamava mundos maiores
Para ser livre
Livre em qualquer tempo
Livre em qualquer espaço
Sigo agora como espectro
No caminho por todos evitado
Sigo sem destino
Sem riso
Sem lágrimas
Sem mágoas
Desnascendo a cada trôpego passo
Tropeçando nos restos de mim
Tombando em cada passo dado
Erguendo-me a cada queda
A morte sem glória
Mas a morte recebida de pé
Hoje mais não sou
Que simulacro de vida
Senhor de reino deserto
Habitante de um mundo vazio
Hoje dispo-me de prantos e gargalhadas
Desnudo-me de alegrias e tristezas
Desvendo inventados sonhos
Hoje posso ser já cadáver
Irremediavelmente morto
Irredutivelmente livre
Na esperança e no desespero
Na vida e na morte
Perpétuo condenado
Eterno amante
Nas asas da liberdade
Dionísio Dinis