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Sofia e o vento dando volta ao mundo em oitenta rajadas

 


Sofia foi mais rápida que o velho índio e pode ouvir o som dos cascos dos cavalos colocando rapidamente o ouvido no chão. Rápido, gritou: “ – Eles caíram”, enquanto Grimaldi chorava sobre o muro terminando um croqui do jóquei clube. Um pouco mais atrás, Sofia montou o apaloosa como joqueta de longa experiência, firmando os delicados pés nos estribos.

“ Usarei folhas de bétula em vez de esporas. Tão perto de mim, tudo vai ficar amarelo como uma caixa de cereais de milho numa propaganda de televisão”. De costas para o chão Grimaldi mantinha o rosto voltado para Meca, acariciando as nuvens como se a idade lhe desse braços estendidos. Com a perna direita ligeiramente dobrada retrucou:

“- Foi tão bom não estar mentindo. As pessoas já fugiram desde que na distancia os raios reluzentes rolaram suavemente. Também houve gente que veio correndo”. Disse isso e levantou as cobertas mantendo a cabeça sobre os ombros. Ao seu lado, Sofia ajeitou o travesseiro e gentilmente colocou o pintainho amarelinho sobre o colchão observando-o sair correndo desajeitadamente, apoiando a cabeça na perna de Grimaldi.

Assim que o motor foi ligado os raios solares passaram a girar brilhando nos eixos celestes. À todo galope e com a locomotiva à todo vapor, à todo momento, o primeiro cavalo da esquerda tropeçava acenando com os estribos. O cocheiro foi jogado e acabou batendo a cabeça numa casa acolhedora e naquele momento, todos seus pensamentos eram únicos e necessários em louvor a todos os mortos.

“ – Um cadáver sonhador sempre deixa a gente mais à vontade. Um dia, caminhando pela praia e observando os trabalhadores desembarcarem do carrinho de mão juntei tantos tijolos e madeira que teria carvão para encher um rio”, disse o cocheiro, antes de exalar o último suspiro. Na gola de sua camisa corria um filete de espuma branca, contrastando com o corpo bronzeado e os olhos embaçados. Sofia exclamou triste:

“- Não deixem as crianças com os pés descalços. Podem se agarrar na pilha de tijolos e abrir o registro”
Em seguida, efetuou log no whatsapp escondendo os calcanhares sujos de carvão. No quadro, uma madona com os seios pendurados sobre o vestíbulo sujo de giz distribuía beijos aos tijolos selecionados. Apesar das cargas opostas serem dobradas, mais de uma vez havia um gay na multidão quando o crupiê começou a roubar.

De repente um grito se ouve naquele silêncio profundo. Mais uma vez, as barcaças movimentam-se lentamente esguichando água do dorso como um cachalote desvairado com soluços. O estivador mostrou ambos os braços enquanto eram distribuídas camisas xadrez para a multidão ensandecida. Lá ao lado, onde a grama semeada no vão dos paralelepípedos já precisava ser aparada, havia teares em pleno funcionamento na faina incansável de urdir panos de prato decorados para salas de jantar.

Grimauld foi puxando o gancho do fecho éclair quando percebeu que tanto a camisa quanto as calças estavam rasgadas. Por ser pessoa facilmente influenciável agarrou o sabre ajudando Sofia a conter o vazamento de água entre as rochas.

“- Não vou fazer isso com o dedo! Não tenho vocação para ser menino que conteve o desmoronamento daquele dique na Holanda”, disse a moça meio desgostosa com a situação, mas mantendo o corpo alongado por que em seguida poderia precisar sacudir as cascas de ostras separando-as dos mariscos espalhados na praia.

“- Deve ser alguma coisa do coração. Cada um que chega repete sempre as mesmas perguntas estúpidas antes de ir embora. Como posso saber quanta água caiu? Sou leigo nesses assuntos de sincronização de ampulhetas”, queixou-se Grimaldi, obtendo total apoio de Sofia.

“- Mas na água tudo pode ser mais tranquilo. Vamos seguir o caminho das pedras como trabalhador devotado sorvendo vinho. O cotidiano das pessoas é tranquilo. Basta seguir a guia e ouvir os apitos do policial”, disse ela.

E estava coberta de razão. O cocheiro, quando percebeu que o vinho estava estragado voltou ao mundo dos vivos e novamente começou a medir a febre com meneios da cabeça. Mas, todos ficaram mudos e deixaram que corressem os pensamentos precisos como um relógio suíço. Claro que estavam todos cansados, mas havia amor e a vida era bem mais feliz agora que as pessoas fazem selfies sem olhar nos olhos umas das outras. Isso por que o calor impede que durante o dia haja um sono bom, com músicas e som do vento dando a volta ao mundo em oitenta rajadas.






 
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FilamposKanoziro
 
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