Não sei se existe ainda a palavra, com a qual se possa dissertar sobre algo que tenha a ver com a alma que damos às coisas.
Como se vem sabendo, com o tempo tudo passa e muitas vezes até se esquece. Não sei se é assim com tudo o que ainda se firma entre os dedos, por termos nas mãos o destino que muitas vezes nos acontece. É que se firmam muitas vezes as mãos em punho sobre a mesa, onde se escreveram odes a todas as coisas.
Sei que por muito pouco,o meu olhar não atingiu essa presença envolta num véu de onde se soltavam gemidos traídos por um céu replecto de sombras. Lembro-me tantas vezes porque nunca o meu olhar nos traiu, quando nos encontrávamos à beira mar e falávamos de um rio que ainda corre por montes e vales. Seguimos por novos caminhos, porque nada nos faz ficar presos ao passado, tão-pouco juntos.
Que bom que é, não ter passado nem presente e nem futuro. Que bom que é, Ser-se só, e sem nenhuma ordem de tempo. Se por lá houvesse algo que talvez se pudesse trazer para o presente, e quiçá levar todos os acordes desse som para um futuro próximo, onde os poemas se construíssem e não se substituíssem por qualquer ordem imposta por poetas, que no presente fazem histórias estruturadas com ecos impostos pelo pensamento abstracto.
Sei de um tempo, em que acreditar nas palavras com as quais se escreviam poemas, era um monocórdico volume, adulterado por um movimento aberto para quem quisesse ser seu amante, mesmo que o som fosse ultrajado por qualquer poema mastigado e depois cuspido. Lembra-me este facto um tal desaguisado entre um livro com poetas e não poetas, que prometiam ser fiéis à sua alma, mas que por qualquer razão dominante, se juntavam e se decapitavam uns e outros na mesma arena.
Recordo uma maldição antiga, que foi quando o tempo se engoliu a si próprio quando por causa do futuro se mantiveram as mesas de honra voltadas ao contrário.
Dolores Marques