Despertou-se.
Assustado, se viu deitado na calçada.
No bolso ainda tinha um maço de cigarros.
Encontrou o isqueiro e acendeu um.
A cabeça girava um pouco e pouco doía.
Sentou-se encostado na parede do bar.
Ouvia-se o ruído noturno. Era alta madrugada.
Ainda restava um pouco de cerveja na lata.
Deu mais uma golada. Deu mais um trago.
Cintilavam, amarelecidas, as luzes das cidade.
Notou que haviam lhe roubado o sapato.
Notou que haviam lhe roubado a carteira.
Nem se importou. Já haviam lhe roubado
O seu bem mais precioso: A dignidade.
O vento balançava seus cabelos gigantes.
O vento balançava sua barba espessa.
O vento balançava uma folha na rua...
Seus olhos sonsos acompanhavam o balé.
Seus olhos tontos se divertiam com a sinfonia.
Ouviu um cacarejar de puta na esquina.
Ouviu o bravejar de um travesti do outro lado.
Ouviu, da pedra no cachimbo do mendigo, o chiado.
Perguntou-se: Quem sou eu?
Riu-se da pergunta que não tinha resposta.
Riu-se da sua situação deplorável e egoísta.
Riu-se de si mesmo e de seu enfadonho destino.
Chorou.
Primeiro foram algumas lágrimas sentidas.
Depois foram muitas, caudalosas e torrenciais.
Perguntou-se: Onde estarão os meus pais?
Que fim levaram os meus filhos?
Passou um ônibus lotado da primeira leva da manhã.
Passou um táxi vazio numa velocidade vagarosa.
Deu mais um trago no cigarro que tinha espessa brasa.
Bebeu o resto da cerveja que restava no fundo da lata.
Sentiu-se o mais pobre de todos os diabos.
Sentiu-se o mais infeliz de todos os mundos.
Sentiu uma dor de cabeça por causa da ressaca.
Deitou-se novamente e entrou num sono profundo.
Gyl Ferrys