E por não te ver, não me perco a imaginar-te.
Paisagem distante, pensamento também distante
Que por ser longínquo, nada é aqui
E nele, nada sou, senão a névoa que o envolve
Porto imaginário onde se apronta um barco cheio de si
Sem tripulantes nem passageiros
Ilusão da consciência de ser barco e de existir
De real, nada é e nele sou nada ao leme
Cansado da viagem que não fiz
Com saudade da terra de onde ainda não parti
Não sou mais que um projecto prestes a deixar o papel
Com a consciência futura da obra feita
E esta frase dói-me como se me arrancassem a pele
Expondo a ruína toda que está por baixo
Só a verdade liberta a dor, mesmo que doa.
Liberto-me dos conceitos, dos preconceitos
Permito-me não ser a consciência colada ao nome
À pessoa por quem me conheço
Ao meu reflexo no espelho
Para ir além do sonho e viver
Navega à deriva barco de pele
Sente a angústia de perder o vento
E sem porto, ou amarra de corpo quente
No fim, naufragas, também em pensamento.
Viver é sair para a rua de manhã, aprender a amar e à noite voltar para casa.