Poemas : 

A aflição do silêncio da carne quando a alma levanta a voz...

 



Talvez não tenha o direito de pensar...

talvez o mais correcto em mim

seja sempre o sentir...

Porque me rasgam estas dúvidas

tão profundamente o peito?

De onde chegam vocês

agora que sentia tudo perfeito à minha volta?

Tenho a carne agrafada ao corpo...

suada e aflita

porque não se consegue soltar

e desesperadamente sabe que quer voar

e em pedaços suculentos se doar.

Falta sentir os teus dedos pedindo

para me aproximar com a respiração encravada...

Falta sentir que beijo cerejas

e que sem mim a água tem sede

quando escorre nos rasgos da minha boca...

Este sentimento vai e vem cá dentro

e deixa-me louca...

tenho ondas no olhar

e riscas coloridas

desenhadas às pressas

que me turvam a visão...

Apetece-me estalar o que sinto

forte contra o rosto despido

e interrogar a alma até à exaustão...

Porque te sentes sozinha

nas palavras que debitas

com o coração envergonhado?

Porque não corres para os meus braços

como se o mundo fosse acabar amanhã..?

não só para ti...

mas para mim também

porque eu sou só uma brisa que hoje por ti passa

e amanhã posso ser chuva desnorteada

desfeita num chão.

Deixa-me morrer aos poucos...

voar por cima das montanhas

que amargamente levo às costas

e tantas vezes me fazem viajar

em círculos infinitos

que não parecem ter fim.

As borboletas perdem a cor

mas viram todos os arco-íris de perto

antes de serem tela a preto e branco...

As formigas esmagam-se com um simples passo

mas já percorreram tantos caminhos desconhecidos

antes de serem pó na estrada...

As flores murcham com o cair da primavera

mas já perfumaram tantas peles

antes de perderem todas as pétalas ...


Inspiro...

Roubo aos pulmões toda a postura

e o ar sai-me curvado pela boca

já cansado de tanto fugir

com soluços a vibrar na garganta.


Sinto...

Será que tenho o direito de sentir

se nem nas palavras me acredito?


Escrevo...

Aqui nasço e renasço cem vezes

com o coração completamente à toa

e abraçada às palavras

mato o medo de me perder...



Daniela Pereira

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Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 15/02/2008 10:57  Atualizado: 15/02/2008 10:57
 Re: A aflição do silêncio da carne quando a alma levanta ...
Forte, sensual, poético, sublimante.parabéns.
hp