Se o homem não for capaz de organizar a economia mundial de forma a satisfazer as necessidades de uma humanidade que está a morrer de fome e de tudo, que humanidade é esta?
Nós, que enchemos a boca com a palavra humanidade, acho que ainda não chegamos a isso, não somos seres humanos.
Talvez cheguemos um dia a sê-lo, mas não somos, falta-nos mesmo muito. Temos aí o espetáculo do mundo e é uma coisa arrepiante.
Vivemos ao lado de tudo o que é negativo como se não tivesse qualquer importância, a banalização do horror, a banalização da violência, da morte, sobretudo se for a morte dos outros, claro.
Tanto nos faz que esteja a morrer gente em Sarajevo, e também não devemos falar desta cidade, porque o mundo é um imenso Sarajevo.
E enquanto a consciência das pessoas não despertar isto continuará igual. Porque muito do que se faz, faz-se para nos manter a todos na abulia, na carência de vontade, para diminuir a nossa capacidade de intervenção cívica.
José de Sousa Saramago, Portugal
(1922-2010), escritor [Nobel 1998], In: Canárias, 1994.
Picture: Povo grego celebra em frente ao Parlamento Grego, a vitória do Não no referendo da austeridade proposta pelo mercado na zona do euro, em 5 de julho de 2015.