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RicardoC | Publicado: 24/06/2015 12:35 Atualizado: 24/06/2015 12:35 |
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Re: A TEINIAGUÁ
Em meados dos anos noventa, havia em Belo Horizonte um sebo antigo bem no hipercentro que eu frequentava na esperança de algum livro incomum.
Eu adorava aquele lugar! Era uma loja entulhada de livros e revistas bolorentas cuja disposição caótica reforçava a ideia de um achado fortuito. E um dia houve: "FLORILÉGIO CASTELLANO" de Adolfo POZO Y POZO... Era uma coletânea de poesias em espanhol apresentadas em didático recorte historicista. No capítulo medieval, informava de um poeta que apresentou a El-Rey um poema de trezentas rimas e esse, encantado, pediu que se lhe acrescentassem mais sessenta e cinco para que "fosse uma para cada dia do ano". E assim foi feito. A partir dessa historieta, pensei uma forma poética fixa para poemas épicos plasmados na tradição ibérica e foi daí que surgiram as "RIMAS TREZENTAS". É isso. |
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RicardoC | Publicado: 24/06/2015 14:03 Atualizado: 26/06/2015 11:57 |
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Re: A TEINIAGUÁ
A lenda da salamanca do Jarau, onde figura a Teiniaguá, fora registrada por José Simões Lopes Neto em inícios do século XX no livro "Lendas do Sul", que li junto com outros textos regionalistas ainda adolescente.
Já adulto, também a encontrei em "O Tempo e o Vento" de Érico Veríssimo, na parte "O Continente". Todavia, foi em viagem à fronteira do Paraguai, em Foz do Iguaçu, no natal de 2010, que tive ânimo de escrever uma nova versão em poesia épica. Lá, travei contato com a língua guarani e me acerquei mais da história das missões jesuíticas que se desenvolveram desde Guaíra, ali perto. Por isso, escrevi. |
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RicardoC | Publicado: 24/06/2015 20:52 Atualizado: 24/06/2015 20:52 |
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Re: A TEINIAGUÁ
A lenda de Teiniaguá é uma história que intenta explicar a formação do povo "crioulo", isto é, mestiço. Ao mesmo tempo, é uma história de amor cheia de reviravoltas e entremeada de eventos sobrenaturais. Passei o dia revisando-a. Considero essa versão, às 17hs57 - 24 06 2015, a primeira revisão.
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RicardoC | Publicado: 25/06/2015 20:02 Atualizado: 25/06/2015 20:02 |
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Re: A TEINIAGUÁ
Texto em 2° revisão. Contei a métrica, verso por verso, e verifiquei incoerências e más concordâncias. Espero que aprecieis. 17hs07 - 25 06 2015.
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RicardoC | Publicado: 26/06/2015 11:29 Atualizado: 26/06/2015 11:29 |
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Re: A TEINIAGUÁ
1 Referência a "Lendas do Sul" (1913) de SIMÃO LOPES NETO e "O Continente" (1949) de ÉRICO VERÍSSIMO. O poeta reconhece o desafio de narrar uma lenda já contada por escritores consagrados em livros excepcionais. A lenda da Teiniaguá, ou Teiuaguá, corresponde ao ciclo de narrativas formadoras do povo brasileiro.
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RicardoC | Publicado: 26/06/2015 14:42 Atualizado: 26/06/2015 14:42 |
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Re: A TEINIAGUÁ
Por não ser meridional, o poeta se escusa de eventuais falhas na exposição da lenda diante dos leitores das "querências queridas", i.e., os sul-rio-grandenses.
O brasileiro, em particular, e o latinoamerticano, em geral, são oriundos da miscigenação racial e cultural que os diferem de outros povos e nações. |
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RicardoC | Publicado: 26/06/2015 18:04 Atualizado: 26/06/2015 18:04 |
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Re: A TEINIAGUÁ
Há toda uma iconografia em torno da representação artística da salamandra Teiniaguá. Também chamada Teiuaguá - do Tupi: teiú (lagarto) goá (redondo).
Em geral, parece ser um lagarto de cores garridas que tem um rubi enorme encrustado na cabeça, sobre os olhos. Repare-se que lagartixas e salamandras são animais comumente encontrados em ruínas e furnas, i.e., os locais que tipicamente ocultam tesouros na tradição ibérica. |
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RicardoC | Publicado: 26/06/2015 22:09 Atualizado: 26/06/2015 22:11 |
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Re: A TEINIAGUÁ
A lenda de Teiniaguá, ao contrário da maioria das lendas, tem lugar em localidades reais. A história se inicia na região de Salamanca, na Espanha. De lá, ela se disfarça de velha e, misturada com os castelhanos, vem para a região das Missões, que no início do século XVIII que era desde Guaíra, no Paraná, e vinha ao longo dos rios da bacia platina, onde hoje o Paraguai, Entre Rios e Corrientes, na Argentina e o oeste gaúcho. Aqui, ela seduz o Sacristão em San Tomé, na margem direita do Rio Uruguai, e fogem juntos para o Cerro do Jarau, em Quaraí - RS.
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RicardoC | Publicado: 27/06/2015 10:55 Atualizado: 27/06/2015 10:56 |
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Re: A TEINIAGUÁ
As questões mais persistentes para mim em relação à poesia épica são justamente o seu formato e temática. Há-que se contar uma história em versos, mas não de qualquer modo e qualquer tema. As trezentas, penso eu, têm o tamanho certo para não serem de leitura enfadonha, onde a redondilha maior -- junto com um padrão de rimas generoso -- obtém a linha melódica mais corrente do vernáculo. Assim, as estrofes fluem...
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RicardoC | Publicado: 27/06/2015 14:47 Atualizado: 27/06/2015 14:47 |
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Re: A TEINIAGUÁ
Acabei de ler uma coletânea de lendas folclóricas em que essa mesma lenda é apresentada com o nome "CARBÚNCULO" em referência ao rubi incrustado na cabeça da salamandra. Nessa versão, a lenda se resume à ambição do sacristão diante das riquezas que a salamandra guarda, logo, não há o elemento feminino e tampouco afetividade. É comum as narrativas folclóricas serem bem díspares às vezes.
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RicardoC | Publicado: 27/06/2015 16:33 Atualizado: 27/06/2015 16:33 |
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Re: A TEINIAGUÁ
Na cultura popular ibérica são comuns os relatos de tesouros enterrados pelos mouros em grutas ermas, ruínas de castros, ermidas abandonas etc... Com a Reconquista, os mouros teriam deixado tesouros ocultos à medida que cediam território ao avanço dos reinos cristãos do norte da Península Ibérica. A princesa moura enfeitiçada seria guardiã de um desses tesouros pelos séculos e teria fugido para a América do Sul disfarçada de velha.
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RicardoC | Publicado: 28/06/2015 12:26 Atualizado: 28/06/2015 12:29 |
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Re: A TEINIAGUÁ
Por dedução simples, qualifiquei o sacristão como ameríndio, apesar das fontes da lenda não o estabelecerem inequivocamente. Isto porque a princesa moura - quer de origem moçárabe; quer marroquina - é branca e europeia. Portanto, o sacristão -- que funda com ela o povo crioulo -- é indígena das Missões.
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RicardoC | Publicado: 28/06/2015 14:51 Atualizado: 28/06/2015 14:51 |
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Re: A TEINIAGUÁ
A princesa e o sacristão atravessam os séculos presos a um encantamento místico -- a guarda de tesouros que mantém jovem a princesa, na Europa; e sua transformação em lagartixa com o carbúnculo brilhante, na América. O desencatamento, aparentemente, vem de um ato de contrição do sacristão -- que passa a participar da maldição da moura -- voltando à amizade com Cristo que, onipotente, ajuda o herói a superar tentações semelhantes àquelas que Santo Antão descreve.
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RicardoC | Publicado: 28/06/2015 16:40 Atualizado: 28/06/2015 16:40 |
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Re: A TEINIAGUÁ
Provavelmente, A TEINIAGUÁ é o melhor poema que escrevi. Estou apaixonado pela história e pelas possibilidades da poesia épica nesse formato das TREZENTAS.
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RicardoC | Publicado: 29/06/2015 00:37 Atualizado: 29/06/2015 10:40 |
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Re: A TEINIAGUÁ
Carbúnculo: nome da granada almandina, lapidada em cabuchão. Pedra preciosa, variedade de rubi muito brilhante.
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RicardoC | Publicado: 29/06/2015 00:37 Atualizado: 29/06/2015 00:38 |
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Re: A TEINIAGUÁ
Teiniaguá ou Teiuaguá? Eis a questão...
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RicardoC | Publicado: 29/06/2015 10:34 Atualizado: 29/06/2015 10:34 |
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Re: A TEINIAGUÁ
As "sete provas de coragem" são descritas por SIMÃO LOPES em sua narrativa. Para introduzi-las na narrativa, o herói antes toma um chá que o entorpece e o leva a uma situação de quase-morte. É entorpecido que ele narra, em primeira pessoa, o enfrentamento de ameaças sobrenaturais que animam sombras, feras, esqueletos, línguas de fogo vulcânicas, cascavéis enormes, jovenzinhas enganosas e mesmo anões. Mesmo atravessando tantos cenário amedrontadores, ele persevera.
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RicardoC | Publicado: 29/06/2015 11:42 Atualizado: 29/06/2015 11:42 |
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Re: A TEINIAGUÁ
A lenda narra que o sacristão furtou vinho canônico sem especificar se o mesmo já estava consagrado ou não... O desastre coletivo faz menção antes às Guerras Guaraníticas e à expulsão dos jesuítas dos domínios lusos e castelhanos em decorrência das decisões negociadas no Tratado de Madrid. E a Teiniaguá, em forma de salamandra, foge para as barrancas do rio Uruguai, que corta a então missão de San Tomé.
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RicardoC | Publicado: 29/06/2015 14:43 Atualizado: 29/06/2015 14:43 |
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Re: A TEINIAGUÁ
A cidade de São Tomé: na atual província de Corrientes - Argentina, era uma das missões jesuíticas da bacia do rio da Prata. Às margens do rio Uruguai, fica em um meandro que cerca a povoação desde o norte até sudoeste.
O Cerro do Jarau: Trata-se de um conjunto de elevações que se destaca no pampa circundante. Localizada no município de Quaraí - RS, isto é, à margem oposta do rio Uruguai e a cerca de 200km da Vila de São Tomé. |
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RicardoC | Publicado: 29/06/2015 22:52 Atualizado: 29/06/2015 22:52 |
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Re: A TEINIAGUÁ
O final da lenda na versão de SIMÃO LOPES é muito complicado e mesmo menos verossímil: a moura é transformada em tapuia! Muito mais simples, penso eu, é presumir que o sacristão fosse já ameríndio. A princesa enfeitiçada, da Espanha islâmica, era branca e européia. Mais simples para a formação do mestiço latinoamericano.
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RicardoC | Publicado: 30/06/2015 10:33 Atualizado: 30/06/2015 10:33 |
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Re: A TEINIAGUÁ
Em Minas, usa-se a palavra "tiú" para designar lagartos grandes. A forma dicionarizada, oriunda do tupi-guarani, é "teiú", que compõe o nome indígena da salamandra de carbúnculo, i. e., Teiuaguá.
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RicardoC | Publicado: 30/06/2015 15:16 Atualizado: 30/06/2015 15:16 |
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Re: A TEINIAGUÁ
"Alma forte e coração sereno". Mote repetido pelo gaúcho em todas as provas de coragem na versão de SIMÃO LOPES para a lenda.
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RicardoC | Publicado: 30/06/2015 23:19 Atualizado: 01/07/2015 14:56 |
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Re: A TEINIAGUÁ
O mais estimulante em se recontar as lendas é a liberdade de interpretação que a narrativa mítica permite. Quer como explicação do inexplicável; quer como argumento sempre remodelado por quem o conta; a lenda ou mito é a história que nos faz pensar a realidade coletiva por meio de heróis e anti-heróis.
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RicardoC | Publicado: 01/07/2015 14:55 Atualizado: 01/07/2015 14:55 |
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Re: A TEINIAGUÁ
"Jaguaretê": do guarani: ya'war-e'te "fera verdadeira". Com a colonização, a palavra "jaguá" usada para feras em geral passou a designar os cachorros trazidos pelos europeus. Portanto, para diferenciá-los das onças, os ameríndios introduziram o sufixo "ete" que significa "verdadeiro". Hoje, "jaguaretê" é o nome dado às onças pintadas e "puma" às onças pardas.
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RicardoC | Publicado: 02/07/2015 00:16 Atualizado: 02/07/2015 00:16 |
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Re: A TEINIAGUÁ
Apesar de não estar dicionarizada, o vocábulo "salamanca" é definida como "furna mágica" em "Lendas do Sul", em referência aos lugares ermos. A palavra remete a Salamanca, na Espanha, onde corriam lendas seculares a respeito de esconderijos de grandes tesouros guardados por princesas enfeitiçadas. Aparentemente, os jesuítas trouxeram tais relatos à América do Sul.
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RicardoC | Publicado: 06/07/2015 16:13 Atualizado: 06/07/2015 16:13 |
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Re: TEINIAGUÁ - a salamandra do carbúnculo.
Em função do título do próximo épico folclórico da série -- a saber, DONA BRANCA, RAINHA - a mula sem cabeça -- mudei o título do poema salientando a entidade sobrenatural no subtítulo. Assim, tem-se: TEINIAGUÁ - a salamandra do carbúnculo.
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RicardoC | Publicado: 08/07/2015 04:00 Atualizado: 08/07/2015 04:00 |
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Re: TEINIAGUÁ - a salamandra do carbúnculo.
Tenho trabalhado em outro poema em trezentas rimas em redondilha maior, esse, sobre a mula sem cabeça. Espero que tenha sucesso.
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RicardoC | Publicado: 08/07/2015 12:39 Atualizado: 08/07/2015 12:39 |
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Re: TEINIAGUÁ - a salamandra do carbúnculo.
Na narrativa de SIMÃO LOPES, o herói gaúcho tem nome: Blau Nunes! Desconheço totalmente d'onde pode tê-lo originado.
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