Sou essa manhã submersa em nevoeiro que esconde o sol do teu sorriso ameno. Sou a tristeza da pedra personificada inerte num qualquer espaço sem flores. Sou um ébrio ressacado no aguaceiro, nu, flácido, obeso, furiosamente obsceno. Sou a besta à força retida em paliçada, negada de afagos, na morte de estertores.
És a tarde submersa em ritos de dança ondulantes ao som de liras e trombetas. És o contorno de corpos em gestação, prenhos de folias eróticas da natureza. És amazona em riste, armada de lança, que me feres de amores infiéis de operetas. És a musa, princesa de véus em mão, nua e velada, e me acorrentas à incerteza.
Nós, em mim, somos a noite submersa em pesadelos brutais de negro e sangue. Nós, em ti, somos a vingança desejada pelas excelsas deusas das mentiras ciosas. E a minha noite resta solitária, imersa no catre que acolhe meu corpo exangue. E a tua noite é noite duma orgia festejada entre rimas de poemas e satíricas prosas.