Rasgaram-me o corpo, era feito de pó,
meus olhos de timbre, toldados sem sorte,
mil gentes em torno, deixaram-me só,
um corpo esquecido diante da morte!
À sombra das aves deixei o tormento,
numa praia esquecida na dor das marés,
meu corpo com vida mas sem pensamento
foi à deriva, ficou no convés ...
No convés do destino que a vida me dá,
levo uma dor que o peito trespassa,
haja o que houver, vá eu onde vá,
é um turvo lamento que à loucura me enlaça.
É uma triste solidão que me atravessa
enrredando em névoa o pensamento,
é um procurar caminho cheio de pressa
sem ter para onde ir em passo lento ...
É um esperar eterno que não começa
é um amar alguém sem sentimento,
é um olhar que em mim tropeça
no sentir de um vácuo encantamento.
É em mim um tédio ou uma loucura?!
É angustia que caminha sem ter para onde ir,
é em mim, em cada um, passagem escura,
destino do qual ninguém pode fugir!
É sem vontade, a minha vida exposta,
como o pó do corpo que envelhece o coração,
é pergunta, numa busca sem resposta,
que depõe a tristeza, em ventos de solidão ...
Ricardo Maria Louro
em Lisboa
Ricardo Maria Louro