Fase I :
Enquanto escrevo
Deposito-me.
Jorro de mim por completo
Cada palavra é minha
o meu ser
o meu pensamento.
Fase II :
As palavras mal fadadas
O peso que corrompe.
O verso que liberta
ATPs que a vida não retorna
o peito cheio aberto
na simplicidade de ser.
Fase III :
O agoirar das palavras alheias
Os olhos de sebo que as lêem.
O interpretar incomum
A frouxidão mental
O vómito fácil e podre
De sílabas não direccionadas.
Fase IV :
Os gritos e calamentos
Os sabões e os jumentos.
Os proclamadores e altruístas
de tigela meia de porcaria
(em que eu não diria porcaria
se pudesse dizer a realidade).
Fase V :
A capa dos que ficam
A máscara de ferro.
Os códigos de conduta injectados
os dedos e a língua cortados.
As palas nos burros,
coitados.
Fase VI :
O desaparecer e a angústia
O chico-espertismo e a incúria.
O perder da arte em si
a condução dos gatafunhos
acaba a arte por ser apenas
aquilo que querem ler os grunhos.
Fase VII :
O esbanjar de palavras finas
Tias de Cascais na esplanada.
As brisas invariáveis
dos mesmos traques humanos
e as senhoras refilando:
são rosas! são rosas, fulano!
Fase VIII :
A total decadência
Dum sítio já sem consistência.
As mesmas paredes pintadas
Pelos mesmos azedos comuns
A colectividade reduzida
Ao nojo de alguns.
Fase IX :
O respeito no desrespeito
A saída por respeitar.
As paredes pintadas de excremento
Os exilados e a sua paixão.
As paredes da casa por dentro
E os que ficam chamam-lhe prisão.
Fase X :
O querer mostrar-se e ser
O querer ser
O pensar poder
O não poder
O nojo hipócrita
Dominando, afinal.
ATP = adenina tri-fosfato. Moeda energética celular.
Enfim. Realmente, é triste o que se passa aqui. Leio o que escrevem os que sempre li e, mesmo que não me lembre sequer de que possam ter alguma vez infringido a nova conduta, percebo-os também a eles, na sua maior parte, revoltados.
Portanto agora não podemos escrever como a poesia é: nós. Não nos podemos escrever. Seja na arte erótica, seja no vocábulo poderoso que é a injúria. Por medo de que pessoas sensíveis leiam? Certamente haverá melhor método para tal.
Tanta coisa e nos anos que aqui passei, nem se lembraram de melhorar, por exemplo, a secção de comentários. Não tenho forma de saber se me respondem aos comentários que faço, porque algo tão simples como um banner indicando comentários respondidos não é implementado. Mas mesquinhices implementam-se. Enfim, típica gerência portuguesa.