A palavra italiana, “Traviata”, foi traduzida para o português do Brasil como “Transviada”; ou seja, aquela que se “transviou dos bons caminhos”.
Foi a forma encontrada, pelos produtores em solo nacional, de não escandalizar a pudíca sociedade do início do século XX, época em que a Ópera debutou no Rio de Janeiro.
Utilizar as outras traduções possíveis, como “cortesã”, “prostituta” etc. seria impensável, já que o gênero se prendia às normas da “moral e dos bons costumes” e qualquer transgressão poderia representar fracasso de crítica e de público.
Contudo, essa concessão acabou gerando um involuntário acerto, haja vista que a atenuação bem combina com a delicadeza de Violetta, apesar de seu comportamento ser dissonante ao padrão. Delicadeza de gestos, de fala e de expressões, que foi magistralmente captada por Verdi, como se pode notar na adequação das Árias que ele compôs para a personagem, as quais, ademais, ressaltam a nobreza de seus sentimentos mais íntimos.
Como já citamos na nota alhures, a personagem original nasceu da pena de Alexandre Dumas Fº, baseada em uma mulher que existiu realmente: a belíssima Alphonsine Plessis, falecida em 1847, aos vinte e três anos de idade, vitima de pneumonia, após uma vida atribulada por paixões, aventuras, festas e escândalos.
A vida de Alphonsine fascinava o público de todas as camadas sociais, tanto por sua enorme beleza, quanto pela forma independente de viver. E com os artistas não era diferente, resultando em uma grande legião de admiradores entre os pintores, os escultores, os escritores etc.
Consta, aliás, que ela teria sido uma das grandes paixões vividas por Dumas que, por isso, imortalizou-a na figura de Marguerite Gauthier, a célebre “Dama das Camélias”, no romance homônimo, publicado em 1848.
O sucesso que o romance logo alcançou foi imenso e quatro anos após o seu lançamento a história foi levada para o Teatro, onde Verdi e o poeta Piave, seu libretista doutras obras, a conheceram, tornando-se imediatamente admiradores da trama, sequiosos em transformarem-na em Ópera.
Após negociar seus direitos, a dupla entregou-se ao trabalho com tamanho afã que Verdi gastou apenas um mês para concluir a parte melódica, sendo acompanhado pari passu por Piave na parte dramatúrgica. Um recorde, já que o prazo normal era de quatro vezes isso.
E ao contrário do adágio popular “a pressa não foi inimiga da perfeição”, pois o trabalho foi feito com enorme competência e sensibilidade e, dessa sorte, após os trinta dias de trabalho diuturno a obra estava pronta para receber os primeiros elogios, que, desde então, nunca mais deixaram de lhe ser ofertados.
São Paulo, 11 de março de 2015.
Lettré, l´art et la Culture. Rio de Janeiro, Verão de 2015.