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O Coração de Sibiline

 
Já se perguntou a quem pertence o coração de uma pessoa? Será que pertence de fato a ela? Ou como todas as outras coisas que achamos que nos pertence, está apenas emprestado por um certo tempo? Se pararmos para pensar, vamos perceber que ele pertence a muitas pessoas diferentes, pertence aos nosso ideais, às nossas paixões, e até mesmo a nossas coisas... Já disse o Senhor: " que onde estiver o nosso tesouro, lá estará também o nosso coração". Pois bem, observando atentamente, vivemos e morremos em função do lugar onde depositamos o nosso coração. Se você ama uma pessoa, morrerá, e até viverá por ela! Se você colocou o seu coração num ideal, ou numa crença, pode acreditar, vai morrer por por esse ideal, e por essa crença. Seja um ideal bom, ou mal. Pessoas morrem todo dia por causa do dinheiro, e vão continuar morreendo enquanto ama-lo tanto.
Havia, digo havia, mas ainda há, um jardim construído ao longo de um rio muito extenso, de um vale também muito largo, que abarca uma floresta inteira com as mais belas plantas e árvores, que pessoas como eu ou você jamais poderiam sonhar. É numa terra mais ou menos mágica, que alguns chamam de Magônia e a qual se pode ter acesso atravessando determinada cachoeira, em determinada época do ano, num determinado local, que eu não posso revelar aqui.
Lá viveu um homem, que vou chamar de Rhalam , e que foi o maior artista que já viveu, e refiro-me o melhor nos dois mundos, ou em quantos mundos puder imaginar! Foi encomendada a ele uma obra para coroar a praça central do magnífico jardim descrito antes, e que foi sem dúvida nenhuma a sua obra prima.
Ele esculpiu em madrepérola, usando tudo de bom que tinha, a mais bela e realista figura em tamanho real nunca antes vista. Era a ninfa das águas e das florestas, a quem deu o nome de Sibiline, porque o vento canta ao seu redor e o seu vestido magistralmente cizelado abraça as árvores em volta dela, como se o ar freneticamente dançasse em seu nome.
Ele se apaixonou por sua própria obra, tal foi a sua destreza em cria-la. Foi tão grande a inspiração que guiou os seus dedos e os seus olhos, que deixou impresso na pedra os traços mais belos e suaves que se possa conceber. E todos os que a contemplavam temiam que a qualquer momento, pudesse Sibiline descer de seu pedestal e dançar ao som das fadas na margem do rio. E foi tão grande o seu amor por ela, que queria que ela vivesse para partilhar com ele a rude vereda de sua vida.
Então, ele fez algo que jamais imaginou fazer. Atravessou um mundo inteiro, e uma história de aventuras, para ver Aine a rainha das fadas, e pedi-la um favor. Ele queria que ela desse vida à sua Sibiline, para que ela pudesse ver quão lindo era aquele mundo e como ele a amava.
Aine podia muitas coisas, mas havia coisas que ela não poderia fazer, e uma delas seria dar vida a algo inanimado. Era preciso mais do que apenas vontade para que Sibiline pudesse viver. Era preciso um coração!
As fadas são instrumentos do destino, por isso a origem da palavra "Fatum" ou fado, ou como prefere alguns, destino! E Aine, sabendo do destino de Rhalam, contou-lhe sobre a Torre de ébano. Uma torre negra e alta, a maneira de uma árvore, que sobe aos céus em patamares cada vez menores, até formar no cimo uma ponta feito agulha. Lá, ele deveria colocar o seu coração, para que a irradiação dele desse vida a Sibiline cá embaixo.
E assim ele o fez! Atravessou mares, desertos e pântanos, e enfrentou seres inomináveis que eram inimigos do amor e da ternura. Para Galgar montanhas e descer desfiladeiros... Para assim, finalmente, encontrar diante do horizonte - altiva e bela - a Torre de Ébano.
Ele precisou escala-la, e ao subir teve de enfrentar os seus tentáculos em forma de galhos, que de forma muito violenta procuravam impedir que ele atingisse o seu cume, e lá desse vida ao seu amor.
Rhalam chegou ao pico, e lá de cima viu todos os reinos daquele mundo, através de nuvens rosas de um céu muito azul. A ponta da torre esperava o seu coração, e uma luz intensamente vermelha brilhou em seu peito. Era o seu coração batendo, quente e forte, pronto para se tornar o farol que guiaria Sibiline para a vida, tirando-a dos mares revoltos da escuridão.
O brilho veio quente e pulsante entre os seus dedos, então Rhalam o cravou na ponta da torre, como um orb de luz que se deita na ponta de uma flecha. E lá ele fulgurou em mil clarões escarlates, cintilando e rasgando os céus como uma estrela, para finalmente abrir os olhos de Sibiline!

Ela estava viva! Desceu de seu pedestal, onde fora cuidadosamente colocada, e pela primeira vez sentiu a relva verde entre os dedos dos seus pés, o ar fresco das montanhas invadir os seus pulmões e a luz do sol aquecer a sua pele e afagar os seus olhos espantados.
Lá na frente, na fronteira do horizonte, um diminuto brilho vermelho, como um astro distante, não mereceu a sua atenção. No alto, no pico da grande torre, ainda acima das nuvens, a figura de um homem agora jaz congelado no tempo em seu último gesto.
É lá que está até hoje, como uma estátua real como nenhuma outra jamais feita, Rhalam, o seu amor e todas as suas melhores intenções. Petrificado em madrepérola, no exato momento em que atravessou o seu coração na estaca da torre.
Me disseram que o seu desejo se realizou. Sibiline pôde ver o quão lindo é aquele mundo, e ao ver a estrela vermelha brilhar no horizonte, pôde saber o quanto ele a amou.


j

 
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London
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