No fim de uma estrada de chão, tão comprida que atravessa o horizonte visível, jaz um imenso castelo gótico coberto de neve, que de tão branca, ao refletir a luz do sol chega a cegar, temporariamente, um viajante desavisado. Foi erguido há séculos, muitos séculos mesmo, antes dos historiadores nascerem, e da palavra história ainda ter um significado. Dorme, imperturbável, sobre o cume fino de uma montanha esquiva, num dos cantões da Hungria, desde quando toda a Europa não passava de um grande feudo, e o próprio país, sequer existia.
Ele é cercado por desfiladeiros íngremes de centenas de metros de profundidade, e por montanhas tão afiadas, que lembram a boca de uma fera carregada de dentes ameaçadores. O frio sopra com tal ardência e sem piedade, que congela até a alma os peregrinos que atrevem a se aventurar por ali. E isso não foi uma força de expressão! Nessas estranhas paragens, não é raro de se ver figuras humanas congeladas no tempo, em pleno ato de caminhar, como que tomados de repente pelo destino, prolongando-lhes o eterno agora. Já não são nada mais, apenas estátuas centenárias, que jamais descansarão!
E é, pois, no fundo deste palácio sombrio, no qual o próprio mal evita se aproximar, que vive um rapaz de aparência jovial. No entanto, mais velho do que o próprio castelo que habita... e do que, talvez, o próprio tempo.
Há um tesouro no mais afastado dos cômodos, no mais amplo dos quartos, no mais protegido dos lugares da Terra, onde o inverno, semelhante a um velho descabelado e de barba comprida e alva, sopra pessoalmente com o seu hálito frio, o gelo de todas as eras do universo! Um tesouro que o velho rapaz guarda com todo o zelo do mundo. O corpo inerte do primeiro e último amor que teve...
Por causa do frio o corpo jamais irá se decompor. E ali, ele contempla, com o olhar mais triste do mundo, a única coisa que ele nunca cansou de olhar ante as eras do planeta.
Ele está lá, eu posso vê-lo! Sentado junto a uma parede escura e fria, sempre olhando para a razão de sua alma...
Ele não vai morrer nunca! Porque a morte em pessoa não quer se aproximar dali...
E ele nunca se congelou, por que a chama do amor que traz consigo, o mantém vivo, quente e condenado...
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