QUANDO ERGO A MÃO QUEBRA-SE A ESPADA
Quando ergo a espada quebra-se a mão!
Uma intensa chuva de pedras
Bombardeia dos céus sem piedade
A marcha triunfal dos derrotados.
A morte invade as ruas e clama desordem…
Quando levanto a voz fico afónico!
A lava em cinza arrasa montanhas!
O odor nauseabundo dos cadáveres é um vale!
A lepra passeia-se de gravata pelas cidades…
Num céu sem cor
Num lago sem água
Manifestam-se os caminhos que não percorri…
Em cada parede pincelada de grafiteis
Leio o nome de um pássaro sem asas
Que aspira alçar voo numa esquina…
Todo o dia é um lençol de retalhos…
Os desejos aludem ao passado
Que se enrola á volta do pescoço
Como forca!
O saber que se sabe é já perjúrio!
Amotinam-se as pedras das casas derrubadas!
A multidão vive numa imensa agonia…
Se falam da esperança é porque não existe.
A esperança não existe!
As palavras são balas de pistola
Disparadas contra a consciência
Da incredulidade.
Abrem-se as comportas da raiva!
Caminham sombras pelo desatino de ruas de lama
Pedras soltas
E lixo.
Todo o horizonte distorcido e nublado é um sol!
Os penachos incentivam às pequenas caridadezinhas
Para se redimirem do fracasso de nada serem.
A fúria e o ódio caminham de mãos dadas pelos jardins
Escrevem o mote de agoniados poemas estéreis
Coleccionam sentimentos vazios de sentir…
A lua decalca a sombra de um abutre no alto da escarpa
Geme o faminto estômago que procura a presa
Com que saciará a fome de viver.
Se por ventura um cadáver lança um apelo
Exigindo o fim de uma existência moribunda e satânica
Logo o lume saído da boca do dragão
Lhe arranca o coração ou o que resta dele
Atracado á necessidade irresistível de ser engrenagem.
Não há morte que resista a tanto abstracto!
A fisionomia turva dos sobreviventes
Acalenta no ócio incrustado nos ossos
Miragens de paraísos suspensos entre as horas…
Nada fazem
Para além de perturbarem as sombras
Projectadas na calçada carente de áureas e de vida.
Não deixam de ser sombras
Inertes e esquálidas
À espera que a misericórdia do pássaro vadio
Lhe venha sugar a réstia de oxigénio
Que ainda se debate nos alvéolos!
Pelos jardins
O futuro marcha no mito das folhas da velha árvore da sabedoria
Recolhe da seiva o veneno com que alimenta
A esterilidade profunda e inglória.
Apenas os vampiros se banqueteiam numa ceia de sangue e almas
Fundidas a laser no abandono do desespero.
As crianças já não dormem…
As crianças já não dormem
Decepadas as veias
Mordem as pedras e nunca choram…
As crianças já não choram!
O futuro é o pesadelo dum sono acordado!
Já urge a noite…
Já falta a lua…
O sorriso existe como pêndulo dentro das artérias cerradas…
A verdade é uma gazua
Sem madeira para furar!
Uma aragem interroga
A lucidez que resta:
Agora que as dores descobriram a felicidade é que as contestais?
Agora que os crucifixos se enfeitaram de pedrarias é que os odiais?
Agora que os espinhos se envaideceram é que os condenais?
Deixai a vigília dos punhais rondar as casas
Porque elas são feitas de culpas e horrores
Nada têm que ver com quem nelas habita…
Quem as domicilia não são pessoas
São nacos de qualquer coisa e violência
Pois por dentro de tudo o que nunca serão
Talvez encontrem uma migalha de vazio
No espaço que nunca foi preenchido por nada!
Deixai a vergonha varrer ruas, praças e avenidas
Porque ela não é mais que a manifestação da inexistência
Propósito alquímico para se subir ao pedestal do status
Tão grandioso quanto imprestável
Só para deleite do olhar daqueles que nada esperam
Só para deleite do vício estático e desocupado
De aguardar que o nevoeiro se transforme em Midas!
Deixai o mundo morrer como pode!
É mais fácil esculpir a morte nos rostos das cabras
Que descobrir uma agulha de sensatez nas palavras dos homens!
É mais fácil encontrar um ícone de aço esculpido num bar
Que desvendar a verdade no puzzle irracional das atitudes dos homens!
Dizei-me – Para que quereis decifrar tais enigmas?
Enquanto rasgo o poema a terra abre as pernas
Para o perpétuo filho do apocalipse da razão.
As sementes clamam por justiça
No alvorecer dos braços da nova civilização…
Se os passos dados foram arcos de triunfo
Foi porque uma luz os iluminou.
Por dentro da desgraça
O sol insiste em incendiar
Os corações de pujança e alegria…
Para que quereis decifrar tais enigmas?
O vento ruge de novo:
Para que quereis decifrar tais enigmas?
A rudez dos instintos manifesta-se na rudez das atitudes
Quando sepultais mistérios e segredos acumulados
A tantas algemas luz do dia de hoje.
As planícies tornam-se vales imensos
Onde o orgulho constrói labirintos e escava túneis
Crente numa continuidade lamacenta e repetitiva
Daquilo que foi sem mudança e que será!
É aqui que é. Nem bom nem mau. Apenas frívolo!
Aconchego das terríveis justificações que vos acobardam
Turbilhão de precárias indecisões
E insensatez!
Agora que os lamentos se elevam como éter acima da lua
(Porque ainda representam um livro aberto
Quando todas as dúvidas renovam de gritos as consciências)
É que a rouquidão fervilha na aspereza de um aflito!
O ácido dos mais instintos recobra de tanta insanidade…
Porque não sois felizes?
Tudo o que aspiraste por mundo não é o que tendes?
Tudo o que construíste não é o que está construído?
Tudo o que destruíste não está destruído?
Tudo o que invejaste não é o que possuís?
Então…?
Será que o mar da vaidade alguma vez subirá a montanha da inveja?
Pois que chegue a vós em forma de esqueleto
O cheiro alucinante desse sonho nómada
Que erra pelo mundo à procura de um ser
Onde possa ganhar forma
Desvendar os mistérios inexplicáveis
Das razões concretas que nunca o serão!
Quando bater à porta do futuro
Vestido de ideais e sorrisos
Enfeitado de plumas e segredos de cristal
Todos os compêndios escondidos dos brilhantes olhos
Farão esvoaçar as páginas pelo deserto dos inconformados
Os poetas definirão com precisão as miragens
Numa ode extensa lírica e real
E o globo terá a dimensão universal de uma solução…
Desvendar-se-ão os grandes mistérios da poesia!
Breve… Breve chegará o dia!