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não tirem o vento às gaivotas - sampaio rego sou eu
bem que gostaria de ter certezas de umas quantas incertezas – não sou homem de certezas. nunca as tive e creio que nunca as terei – não sou talhado para certezas. ponto final – quando estou perto de uma certeza fico nervoso. fico com pele de galinha. os olhos turvam. os músculos começam a dar de si deixando cair a cabeça para o lado da fuga. as mãos armam-se de suor e num ápice. como se o cérebro se enchesse de pensamentos inflamáveis dá-se a rotura. a combustão é inevitável – tudo agora é fogueira. em dança de guerra. um menino pula à sua volta – tudo arde menos a incerteza – ali fico a olhar para tudo que jamais será certo – nem sei se triste ou perdido. sei que os olhos aflitos procuram o escuro – procuro conforto. imagino eu sem certeza nenhuma – escondo-me atrás de feições que fingem rir enquanto os lábio falam baixinho: um dia isto vai ter que terminar – não basta puxar o cabelo para o lado. não basta tirar fotos ao correr do sol enquanto os pássaros voam vida certa num vento tão incerto como eu – sou assim. não podia ser diferente. nasci avesso às certezas – não tenho certeza de nada. às vezes é dia e dentro de mim há noite mais escura que breu – interrogo-me: será noite ou dia? não respondo por não ter a certeza – já não falo nas palavras que não digo por não ter a certeza de que sejam capazes de dizer o que quero dizer – estou sempre a dizer o que não quero dizer – falo demais e quem fala assim nunca tem a certeza do que diz – se tivesse a certeza de que este texto vos diria como lido mal com as certezas seria outra pessoa – não gosto de certezas porque não gosto que ninguém me diga: vês como tinha razão. tens a mania que sabes tudo – que raio de injustiça. logo eu que nada sei – sei o que vos digo por convicção. por honestidade. por vos querer dar o que melhor há em mim: a minha verdade – raios de mundo. ninguém me quer compreender – antes que possa dizer o que quer que seja da minha certeza já tenho como certo uma pedrada no ego – arrependido retiro-me para dentro de todas as incertezas – finalmente feliz. as incertezas nunca são injustas. impróprias. inconvenientes. agarram-te com um abraço. confortam-te e sem que lhes peças uma palavra dizem-te: estou aqui para alimentar todas as tuas dúvidas. até que nenhuma certeza do mundo exista – as incertezas forram-me o estômago contra o mau estar do que está sempre tudo absolutamente certo – como de um soldo se tratasse a subsistência está garantida para mais uns dias – sou feliz assim – será que sou. talvez não seja – mas que posso eu fazer. nada – tenho a certeza absoluta que nada posso fazer contra as minhas incertezas certas