Porque as minhas alvoradas perderam o brilho,
Ausento-me…
Do mar que me fazia pensar,
Do luar que me deixava sonhar,
Do sol que me aquecia, nas tardes de nostalgia,
Ausento-me…
Das sombras que as árvores da falsidade oferecem,
Dos chilreios das aves tranviadas,
Dos murmúrios das águas dos rios da inveja,
Ausento-me…
Do colorido esmorecido das flores venenosas,
Que nos campos da intriga, intoxicam,
Ausento-me…
Das multidões que gritam vaidades e calam razões,
Das ruas escurecidas pela miséria engravatada,
Da visão de pés descalços e barrigas ocas, pela fome,
Ausento-me…
Da ausência de fraternidade,
Dos sorrisos que escondem punhais,
Dos abraços que sufocam,
Ausento-me…
Da felicidade, que o tempo secou,
Das alegrias sufocadas por bocas fechadas!
Por tudo isto e mais que não disse…
Desisto…
De caminhar por estradas ocultas,
De entrar em competições desleais,
Desisto…
De querer ser franco, porque a franqueza ofende,
De dizer a verdade, porque não é o que se quer ouvir,
Desisto…
De querer ver o mundo em paz,
De ver igualdade social no meu país,
De ouvir insistentemente os politicos mentirem,
Desisto…
De procurar a felicidade,
que se esconde por detrás das vontades,
Desisto…
De querer estar onde não estou,
Da força, que é subjugada pela minha fraqueza,
Dos meus anseios afogados por contrariedades,
Desisto de sorrir, quando a minha alma chora…
Desisto…
Até que a morte não desista de mim!
José Carlos Moutinho