Sobre uma política de segurança pública - mas nem sempre como parte desta - exerce grande influência a questão do analfabetismo e a da fome que se arrastam anacronicamente a despeito dos esforços das sucessivas administrações. Esta questão agravou-se nos últimos anos, com a urbanização e a realidade das megalópoles. A recessão e o desemprego atrelado, frutos da impotência na administração da crise na balança comercial, as dívidas externa e interna, a crise fiscal, tudo isso criou guetos urbanos, marginalizado os suburbanos nas favelas e periferias e os infra-urbanos nos cortiços e viadutos.
A análise dessa situação extrapola o modelo clássico da reengenharia dos monopólios e latifúndios para a distribuição da riqueza e obtenção da justiça social. Autoriza uma visão pessimista da impossibilidade da resolução a um curto prazo dos problemas da segurança pública. A questão adquire contornos de uma catástrofe anunciada. Esta se apoia principalmente nos altos índices de violência urbana, agravada pelo tráfico e consumo de entorpecentes por um número cada vez maior de usuários engrossando as fileiras dos agentes do crime.
Contudo, se por um lado há os que defendem uma organização policial que atue de forma enérgica e eficiente, por outro, os teóricos continuam exalando suas ilações românticas, propondo que se aguarde pacientemente a resolução daqueles problemas crônicos para a erradicação da criminalidade. De certa maneira, o que se propõe é a rendição espontânea dos agentes do crime ao serem conscientizados que são inocentes vítimas da injustiça social. A observação e o reestabelecimento das garantias individuais proporcionariam essa rendição, posto que, o exercício da cidadania revela-se o bálsamo que sana todos os males. A inconsistência desse modelo torna-se a cada dia mais visível. A fragilidade da premissa parte da intima relação entre o cruciante dilema ideológico do triunfo do bem sobre o mal, acima de qualquer outra consideração. Porquanto na atuação da organização policial deva haver o respeito às garantias individuais e a observância às outras forças envolvidas, é necessário que as pseudocontradições ideológicas não venham a constituírem-se nos obstáculos. Ao contrário do que afirmam os ideólogos das elites, a atuação da organização policial não é o problema e sim uma parte da solução da questão da segurança pública.
Uma organização policial moderna, perfeitamente adaptada aos aspectos institucionais sempre se constituirá no fator decisivo para a manutenção da ordem pública e a sustentação da harmonia entre os cidadãos. Deve-se considerar a atuação eficiente e baseada nos verdadeiros parâmetros da cidadania e não nos chamados direitos das minorias marginais. A atuação isolada da organização policial, posto que contraproducente, sempre será mais eficiente que uma atuação marcada incisivamente pela ingerência de forças externas e não direcionadas ao mesmo fim, quer dizer, enquanto a organização policial combate o crime e os agentes criminosos, existem forças direcionadas a combater a organização. Para legitimar essa gestão espúria e descabida está a ênfase ao aspecto teórico da prevalência dos direitos individuais sobre os direitos coletivos, mas inegavelmente, o combate ao crime parte da atuação das organizações policiais que jamais poderão triunfar enquanto existirem tantas forças atuando em sentido contrário.
(Luiz Antônio de Morais, Escrivão de Polícia, ex-presidente da Associação dos Funcionários da Polícia Civil de Piracicaba).
LM.Remora é heterônimo de Luiz Antonio de Morais