- O meu olhar tocado pelo frio nocturno demorava-se naquele cubículo, onde todos se coçavam por entre os folhos rasgados das camisas já gastas. Já me cansa tanta gente nas ruas a esfregar-se na cidade. Ela sem dar por nada arrefece os corpos maldizendo todos os olhos perdidos na noite.
- Sei de um tempo em que se ajoelhavam no chão, como se fossem peregrinos cansados dos pés. O inverno cobre a cidade com um manto negro. Agora tudo é motivo para não caírem em desgraça nas igrejas. Os santos gostam de sossego e alma. O incenso é aroma quente nas suas mãos, o terço rodopia em círculos provocados por uma brisa suave, como se fosse um sopro de Deus.
- Dizem que as promessas são ocasionadas pelo enraizamento da fé e que Deus está em toda a parte, porém ali correm ventos despojados da verdade de Deus. Estou cansada de tanto alarido nas ruas da minha cidade. Por todo o lado nascem profetas. Se pelo menos nascesse por aqui algum…seria uma forma de minimizar a dor desta gente com palavras que os ajudassem na fé em Deus.
- Não sabes se o que os faz pernoitar por ali, é também movido pela fé e cumpram alguma promessa. Há várias formas de se entrar por esses caminhos. Uns de joelhos, outros de pé, outros deitados. Sabes como se cumprem promessas em silêncio?
- Penso que sei. Mas o pensar nem sempre me leva por caminhos da fé. Falta-me sempre uma mão para escrever, um pé para andar, a voz para falar, a boca para comer e a língua para levar a hóstia ao céu-da-boca.
- Perante esse cenário digo-te que talvez o silêncio seja o pensamento em acção. Ou acreditas nele, ou te afastas para saberes onde colocar as mãos quando pensas descrever um olhar que trai todos os teus momentos de fé.
Epifania & Ainafipe
Resulto de um modo de dizer as coisas, simples e belas, e tu és o meu guia, o meu assunto do dia, para me dizeres também, de quando tudo era branco nos meus olhos…
Epifania & Ainafipe