Diz o ditado que a dor, o sofrimento, a tristeza existem para fazer com que conheçamos os dois lados da moeda, ou seja, se existisse só o estado da alegria, da felicidade, do prazer, seria a felicidade tão comum que se tornaria monótona; para quem vive ou já viveu a dor e o sofrimento acerbos, a primeira reação é dizer que prefere viver a monotonia da felicidade permanente a sentir um minuto de sofrimento; interessante observar que são as próprias pessoas que desfrutam do estado de felicidade (que têm dinheiro, saúde, beleza, juventude, conhecimento) que confirmam a tese de que para ser feliz tem de conhecer o sofrimento, a dor, porque é só observar quantos jovens cheios de saúde, beleza, vivendo no conforto e segurança partem para arriscadas aventuras de escalar montanhas, voltam dessas empreita machucados, ralados e... felizes. Eu conheço garotas lindas, de família bem estruturada que têm e podem ter um futuro tranquilo e sem riscos, mas que não aceitam essa “monotonia” e deixam suas famílias para as mais loucas aventuras mundo afora.
Quem já foi cerceado da liberdade por algum motivo, por um mês que seja, sabe o quanto é bom ser livre. Digo isso por experiência própria, nas muitas vezes que tive internado num hospital, eu ficava pensado como seria bom se eu estivesse lá fora, no meio do movimento, dirigindo meu carro naquelas avenidas movimentadas, correndo risco de acidente! Hoje me ocorreu um fato que me reportou a essa experiência. Eu estava dirigindo meu carro numa dessas avenidas movimentadas quando uma senhora me de uma fechada inexplicável, simplesmente saiu da pista dela e invadiu a minha. Eu meti o pé no freio, chegou a cantar os pneus. A senhora ficou apavorada e eu de repente me lembrei, com tanta nitidez, que cheguei a me ver num quarto da Santa Casa quando fiz meu transplante renal quando tive de ficar durante vinte e nove dias internado e isolado! Eu olhava pela janela e pensava no meu carro, e me via dirigindo naquela avenida, no meio do movimento: para mim era a felicidade desejada. Então, enquanto a pobre senhora ficou nervosa sem saber que fazer, eu comecei a rir, mas rir com prazer, com gosto de felicidade, e fui tomado de um desejo de ir lá dar um beijo e agradecer àquela senhora por estar me proporcionando aquele “momento de felicidade”! Sim, eu senti o gosto de ser livre, de ser feliz.
Aquela ocorrência, que outrora me deixaria nervoso, me pareceu tão pequena ante a felicidade de estar livre e dirigindo. Por isso, acho que para tudo há os “dois lados da moeda”. Felicidade, tristeza, liberdade, dor,... tudo tem razão de ser.
Manoel De almeida