Vestindo robe de chambre carmesim, Grimaldi jogou um punhado de alpiste batendo palmas com as mãos negras. Escapou por uma janela a tempo de entregar ao juiz, no último minuto, cartão amarelo para ser usado antes do apito final. De fato, poderia ser de bronze ou um pedaço frio de manteiga, quem ama tem coração de ferro. Ou de leão. Mesmo que o leão seja medroso a caminho de Oz, o coração sempre será valente batendo sob o kilt xadrez tartan ventilado pelas brisas das colinas da Escócia.
Mas será que amava ou não. A partir do rompimento da adutora e do corpo de prova, recuaram as badaladas dos sinos cessando o som das buzinas. Mais e mais a chuva molhava seu rosto. Trovões pulverizavam a cidade assustando os surfistas prateados. Ainda lhe restava algum contentamento, sentia-se como criança passeando no parque em tarde de feriado no dia da guarda do pai divorciado.
Mas não demorou muito. Por volta da meia noite, apenas alguns apaches de caras pintadas, cabelos em mechas descoloridas e cortados à faca restavam. Abatidos deixaram Montana reconhecendo que paradoxalmente, Custer afinal vencera, apesar de Little Bighorn.
“ Que merda!” Praguejou Grimaldi. ”- Isso ainda não foi o suficiente?”
Logo a boca da noite se fecharia e poderia ouvir com calma os gemidos do paciente no leito da UTI. Mas não esperou. Levantou-se nervoso e ainda mal orientado, animou-se a limpar os para brisas multicores dos novos veículos da concessionária, ele e os novos grumetes, numa dança desesperada.
Não percebeu quando o gesso caiu no piso térreo. Mais uma noite fora do quarto de Sofia e tinha as pálpebras sobrecarregadas de lama e molho de tomate.
“ Porque surdos não distinguem as cortinas cinzentas das cadeiras para escritório?” finalizou, com quase uma careta, como o rosto de canibal sedento de sangue roendo a canela de uma pessoa de mau gosto.