O POETA DA LUA
Romance de António Casado
Capítulo primeiro – pág 10 - 12
CAPÍTULO PRIMEIRO
Determinou prioridades temendo uma atitude da mãe. Os antigos amigos assediavam-no, mas recusava-os. Fez novas amizades com as quais partilhava os estudos. O restante tempo dedicava-o a si. Desta vez escutar as matérias nas aulas não era suficiente. Alguns momentos traziam-lhe o desencanto da tristeza como se o fracasso do presente o dominasse e impedisse de ir mais longe impondo barreiras invisíveis e intransponíveis. A vontade de fazer melhor, a certeza de não se sentir motivado, exasperava-o. A luta entre querer e não querer era desgastante!
Leonardo era um aluno mediano e assíduo. Tal como ele tinha poucos amigos. Via-o quase sempre só a deambular pelos corredores. Apesar de os colegas comentarem que era uma pessoa afável, de sorriso nos lábios, terno e sincero, parecia-lhe um árido deserto. Lembrava-lhe uma linda flor plantada no cimo de um prédio de cimento. Ignorava o que o levou a aproximar-se mas sentia-se aconchegado por aquele temperamento vulcânico e delicioso. Era um moço alto, forte, um ano mais velho, de curtos cabelos negros e olhos da mesma cor. As mãos sapudas davam-lhe a impressão de tenazes macias e quentes. Quando havia intervalos entre as aulas saíam da escola e passavam pelo jardim municipal, o Bonfim, o antigo campo do “Anjo da Guarda” como o denominavam; o “ex librís” da cidade de Setúbal assim determinado em 1939. Ao fundo daquele arborizado espaço a Ermida do Senhor Jesus do Bonfim, chamada inicialmente “Ermida do Anjo da Guarda” fundada pelo padre Diogo Mendes em 1669. Passavam depois pelo estádio do Vitória de Setúbal inaugurado a 16 de Setembro de 1962 com a colaboração dos moradores e comerciantes – sempre foi um sonho da população ter um Clube Desportivo representativo da cidade. Dos desentendimentos do primeiro grande clube de futebol “Bonfim Foot-Ball Club” fundado em 1908 e da aliança com o primeiro grupo de destaque o “Setubalense Sporting Club”, que envergava a camisola às riscas verdes e brancas, fundado em 1910, nasceu a 5 de Maio de 1911 o clube “Vitória Foot-Ball Club” que passou a funcionar no Palácio Salema na Rua do Bocage. O estádio estava situado inicialmente no “Campo dos Arcos”. Só em Junho de 1912 é que “Vitória” apresentou ao público pela primeira vez as camisolas que ainda hoje mantém.
Subiram até ao Liceu Nacional de Setúbal e cortavam pelas traseiras. Uma extensa propriedade inculta, recheada de matos e canaviais estendia-se até à Estrada da Baixa de Palmela. Conheciam bem aquele sítio. Esgueiravam-se por uma brecha aberta no canavial e sentavam-se junto ao ribeiro de água doce e transparente que corria por entre as pedras. Era o esconderijo do resto do mundo onde se sentiam libertos de tudo e todos. Viviam a proximidade com a natureza e uma liberdade sem limites. Falavam de tudo o que lhes vinha à cabeça. Riam, choravam, preocupavam-se… tudo ali, junto à serenidade mansa da água. Naquela tarde quente de Abril também. Ainda se fazia sentir um pouco a aragem fria de Março que abandonara o poleiro há três dias. Deitaram-se num pedaço de areia branca junto ao riacho. Alexandre deitou a cabeça sobre os braços cruzados e olhou a pequena nesga de céu por entre as folhas compridas, verdes e viçosas das canas. Leonardo ficou ao lado, virado para ele, apreciando a sua viagem pelo sonho. Um silêncio tranquilo envolveu-os. O mistério daquele recanto transmitia-lhes sensações de placidez e repouso. Leonardo com a mão alisava a areia enquanto Alexandre galopava nas asas de um poema por escrever.
Alexandre despiu o casaco e colocou-o sob a cabeça fazendo de travesseiro. O corpo envolvido pela camisa era atraente. Os traços firmes despertavam em Leonardo sensações de bem-estar.
- Gosto de estar aqui. – Confidenciou Leonardo que continuava a apanhar grãos de areia com a ponta dos dedos e, erguendo o braço, deixava-os cair no chão.
Alexandre não respondeu, nem quando o braço esticou um pouco e alguns grãos secos e frescos lhe agraciaram o peito. Leonardo continuou com os desenhos, agora sobre o ventre do amigo como se de uma mensagem se tratasse.
- Posso chamar-te Alex? – Perguntou-lhe.
Sorriu. Porque não? Era muito mais prático.
- Podes.
A mão sapuda repousou sobre o peito e delicadamente afastou a areia com movimentos tranquilos e suaves. Alex anuía com um sorriso às brincadeiras. Fechava os olhos e lia os movimentos das pontas dos dedos sobre a camisa. Leonardo dobrou-se sobre ele e beijou-o no pescoço. Não se moveu. Soube o que o amigo procurava com aquele gesto quente e gracioso que o deliciou; estava disposto a deixá-lo caminhar, ir até onde quisesse. A inexperiência de qualquer acto sexual impedia-o de tomar uma postura. Sabia que estava prestes a ter uma experiência e isso não o desagradava. A curiosidade de sentir outra pessoa tocá-lo superava qualquer medo ou repulsa. Até aí o único prazer que conhecia era a masturbação que praticava na banheira mergulhado na água quente, ou na cama enrolado nos cobertores. Já se surpreendera nalgumas manhãs quando ao acordar notava que estava molhado. À pressa tentava limpar-se com vergonha que a mãe reparasse nalguma coisa e se enfurecesse. Incomodava-o as erecções matinais principalmente quando Maria dos Anjos o destapava depois de ter inventado mil argumentos para não sair da cama.
Neste momento era a mão de Leonardo que desabotoava a camisa e como esponja a rolava devagarinho sobre a pele palpando os mamilos erectos. Os olhos mantinham-se cerrados à vida que os rodeava e como alguém que passa uma fronteira virtual visualizava as ondas de prazer que cresciam e o estimulavam. Os lábios quentes e rosados do amigo sorviam o calor da pele enquanto a língua acariciava o peito e o externo, de cima para baixo, até se perder no pescoço, subir pelo queixo e deter-se entre os lábios secos de excitação. Era a primeira que o beijavam nos lábios. Estranho, mas não repulsivo.