Vieram e ceifaram os que eram do meu jardim.
Vieram no meio da noite quando, em sonho,
vagava pelas ruas da minha infância,
ainda soldado-raso nas fileiras da vida.
Pela manhã, pus meus olhos nos caules órfãos,
onde a seiva, ainda fresca,
escorria como as lágrimas que os embaçavam
e transformavam o entorno
(estrada, ponte, reses, árvores, tudo, tudo)
em um grande e vistoso Monet.
Imaginava-os em algum vaso
sobre a mesa duma recente viúva,
levados por um parente vindo de última hora
que os viu alento.
Ou, então, no colo d'alguma jovem
assediada por um vilão apaixonado
que os viu conquista.
Quem sabe ainda,
ladeados pela fotografia amarelada de algum ente querido,
roubados por aquele que os viu consolo.
O certo é que, sob a soleira,
sentia o quanto deles havia em mim
e enxergava, minuciosamente,
tudo o que se deu
desde quando eram pequenas e promissoras mudas
nos côncavos das minhas mãos.
Frederico Salvo