Não tenho veleidades literárias, nem quero ser pretendente a candidato concorrente a aspirante a ser chamado de poeta ou autor. Não represento ameaça aos campos cultiváveis e pomares deste país. Muito menos sequer cogito produzir um best seller.
Um exemplo: o que faz Cérbero, o vigia do portão de Hades, ansioso para proteger os seus direitos, quando uma alma tenta fugir? É que sempre disseram que a alma é incorpórea, não sente nenhuma dor. Então, também não deveria sentir medo na cidade, nos campos, nas fábricas e plantações de cana, mesmo no outono ou numa tarde cinzenta de inverno cáustico.
Se a placa silenciosa não cobre todo o corpo, por que então todos dormem se o sono eterno é tão pesado? Certo é que, quando fechar os olhos, levarei o óbolo destinado a Caronte, com os lábios cerrados e mãos fechadas para sempre, coberto de elos incandescentes regados à sangue dos servos temerosos e dos invejosos de plantão.