..........Ninguém apareceu para abrir a porta. Talvez a nenhum outro, a guisa de provinciano quasímodo, apetecesse percorrer tantos degraus da íngreme e tosca escada, num suceder de caracóis debaixo dos cabelos, tendo tanta e tanta coisa para falar sem que viva alma houvesse para ouvir. Pois ninguém menos que Sofia - usando um vestidinho vermelho - preocupava-se com a paz mundial executando uma canção do Jon Bon Jovi em frequência modulada. Nem com tudo o que poderia aparecer caso fosse levantada apenas a ponta do iceberg, já que ouviu dizer que o tapete foi a pique nas gélidas águas boreais depois de atropelar o Titanic sem o clarão da aurora.
..........Olhou fixamente para o ascensorista. Com um só golpe da manopla, ninguém havia movido a aldrava da decrépita porta acenando com o luar refletindo nas alvas cãs que algo orgulhoso já ostentava. Ficou ali mesmo junto ao meio fio vendo os peixes e as rãs. Já havia tomado o desjejum e sentia-se saciada. Se bem que ainda almejasse e muito ansiasse pelo desarmamento nuclear e felicidade geral dos povos. Aquela força estranha brilhando sobre o azul acinzentado fazia com que fosse obrigada a manter a cabeça inclinada, quase encostando a orelha no ombro e quase cantar. Murmurou:
..........“- Pois que bem saibam todos que não estou aqui à procura de desculpas para o insucesso do english team na fase de classificação. Sem falar nos espanhóis e portugueses!”
..........Tudo dito num tom monocromático, algo insípido porém, totalmente inodoro e felizmente, indolor. Quando deu por si, ninguém tinha os cabelos cheios de luz, com brilho incomum. Também pudera! Ninguém poderia ser descuidado e exuberante para aquela realidade que ora se apresentava, pois. Não esperou mais, e disse com firmeza:
..........“- Lamento pelas mães de todos os jovens que se perderam no clímax da adolescência em flor, deixando-se ficar mais de oito horas diárias numa mesa de computador tentando galgar o próximo nível.”
.......... Apressou-se para não deixar que ninguém passasse, mas o feixe de luz parecia um gato brincando de gato e rato com um dálmata. Sentiu-se feliz podendo oferecer arroz aos monges, admirando os trajos cor de abóbora e as cabeças cuidadosamente costuradas com tanto esmero que mal se notava que haviam sido remendadas. Bom que existe o cerzido invisível, não é mesmo?
.......... Ah! Se ela soubesse como são fabricadas salsichas a partir da carne mecanicamente desossada!
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