Permitem uma sugestão fraterna?
Por mais cheio que lhes ande a vida – por mais ocupada, mais apressada, mais atravancada que lhes esteja – descubram meios para rápidas escapadas, que lhes permitam encontros, mesmo de segundos, com a Natureza.
Isto lhe fará um bem enorme e demandará, no íntimo de vocês, um pouco de paz para o resto do dia.
Tenham olhos para o nascer do sol. Já repararam que não há duas madrugadas iguais?
Por que jamais encontram tempo de olhar as árvores, mesmo de passagem, mesmo de caminho?... Elas são mestras de paciência: oferecem sombra, oferecem frutas, acolhem os pássaros, e, quase sempre, recebem pedradas da meninada e, não raro, acabam sendo cortadas, quando o terreno se valoriza. E como ensinam a renascer cada ano, com ânimo novo?...
Já notaram como a água é amiga, é irmã, e está sempre disposta a ajudar-nos de mil maneiras?...É tão bom um copo d’água fria quando se está com sede, que Cristo chegou a prometer uma recompensa eterna a quem mata a sede do próximo.
E como é bom poder banhar-se, ou lavar as mãos ou os pés ... mas a água faz bem até ser vista: se passarem perto da praia, olhem o mar!
Se passarem perto de rios, olhem as águas que descem mansas ou contemplem, um instante, lavadeiras que lavam roupas ou crianças que se banham e brincam na água.
Já tiveram tempo de contemplar a luz que vem do alto? ... A luz torna belas, transfigura, até as coisas mais simples: um caco de vidro, parece um brilhante...
Nunca se lembram do ar que nos cerca, nos protege, apagando, anônimo, prestativo?... Nem pensamos nele e, no entanto, sem ele nem poderíamos viver. Só damos importância ao ar, quando ele nos falta, no fim da vida, e caímos em agonia, à procura dele...
Reparem com que paciência a terra nos suporta. E nós a pisamos como se ela fosse nossa escrava e tivesse obrigação de carregar-nos.
Nós rasgamos a terra, para plantar sementes ou abrir estradas... Um dia, em lugar de guardar-nos rancor, ela nos receberá em seu seio e nela, nossos corpos aguardarão a hora da ressurreição...
Abram os olhos. Descubram o que veem. Façam como as crianças que chamam atenção para tudo, como se fossem as primeiras a descobrir o que veem: “Olha lá!”
Tenham olhos descobridores. Não deixem que a rotina lhes embotem a vista. Um segundo de contemplação da Natureza, demandará paz sobre o seu dia inteiro!
Dom Helder Câmara, (1909-1999), arcebispo de Recife & Olinda.
Imagem: Primavera no Alasca.