Nada — eu não quero nada,
todo querer é sem nexo,
pois tudo se perde
enquanto a vida passa
pela janela da ilusão.
Errei: eu quero uma coisa só;
eu quero sim me livrar
desse terrível gosto ácido
de engasgo com retorno de vômito
que me dá essa vida inacabada!
Bate-me na cara a janela da ilusão
que um dia eu tive sobre amanheceres —
não há mais amanhã,
há só o vazio depois de depois;
há o silêncio de pedras tumulares esquecidas
na solidão duma invernada sem termo;
há o horror de perder uma luta já antes perdida;
há estes versos estercorários que o vento leva ao nada...
Espera! Pela janela da ilusão,
acabo de ver passar o teu vulto fugaz —
que me importa se é o que me resta de ti?
Sombra jamais pisa em sombra, é claro!
_________________
[Desterro, 25 de maio de 2014]