Nós dois no quarto: meu cachorro e eu. Lá fora, a tempestade uiva, desenfreada, assustadora.
O cachorro está sentado à minha frente -e me olha direto nos olhos. Eu também olho para os olhos dele.
Parece que quer me dizer alguma coisa. É mudo, sem fala, nem entende a si mesmo -mas eu o entendo.
Entendo que neste instante, nele e em mim, vive o mesmo sentimento e entre nós não existe a menor diferença.
Somos idênticos; em cada um, arde e brilha a mesma chama, pequena e trêmula.
A morte virá voando, vai abanar sobre essa chama suas asas frias e largas...
E fim! Depois, quem poderá distinguir que chama ardeu em cada um de nós? Não! Não são um animal e um homem que se olham...
São dois pares de olhos idênticos, concentrados um no outro. E em cada par de olhos, no animal e no homem, a mesma vida assustada tenta se agarrar no outro.
Ivan Turgueniev (1818-1883), dramaturgo e poeta russo. Texto traduzido por Rubens Figueiredo.