Esfrego os olhos, tonto de sono, como um rezador sem fé
E vejo um navio calmamente descendo a minha rua,
Anunciando que um avião dorme no fundo do mar, cheio de corpos,
Velando um monte de almas. Ainda nem pro céu foram - então é recente.
Falam de um rio correndo oprimido por margens sorridentes, como nada acontecesse,
Enquanto isso um vento bêbado dorme cambaleando na esquina da minha rua
E um fogo espalha rapidamente savana afora e espanta o coelho da cartola do mágico,
Hoje o homem não terá sorte, a mulher esbandalhou a saia, pintou os olhos, rebocou a alma.
E me perguntaram qual era a cor do amor, como se os amores tivessem cores;
Falam de felicidade, se esquecendo que basta mais um dia de vida, e isto já é felicidade,
Como crianças brincando na praia, rolando na área, ainda têm um sol pra iluminar e aquecer;
Basta existir e isto é bastante, um brinde de Deus, permitido a todos tamanha precariedade.
Pra seguir viagem, montar em cavalo bravo, atravessar a neve esticada na serra, destino final,
Mesmo que o sol ameaça se esconder, com passos delicados, anuncia mais bela madrugada;
Falam da pintura - tinta, pincel e quadro - que é a poesia Divina, bela madre dos homens,
Nesse canto de serra onde a verdade é mentira e mentira é verdade, a gente se encontra.
Esfrego os olhos novamente, como bálsamo, me acalmam,
Me rendo, me entrego diante da vastidão e da fraqueza da espécie...
José Veríssimo
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