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O obstáculo [poetas argentinos] Olga Orozco

 
Tags:  AjAraujo    poeta humanista  
 
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É estreita a porta
por acaso vigiada por cães negros famintos e guardas como cães,
por mais que não sejam vistos senão o espaço alado,
talvez a mostra em branco de uma vertiginosa faísca.

É estreita e incerta e me corta o caminho que promete com cada boas vindas,
com cada cintilar de anunciação.
Não consigo ultrapassar.
Deixaremos para outra vez as grandes migrações,
a profusa equipagem da insônia, minha esforçada escolta de luz nas trevas.
É difícil nascer do outro lado com toda a marejada em seu favor.
Tampouco consigo entrar mesmo que reduza meu séquito ao silêncio,
a uns poucos mistérios, a um memorial de amor, às minhas piores estrelas.
Não cabe sequer uma sombra entre cada investida e a parede.
Inútil insistir enquanto leve comigo um envoltório de possessões transparentes,
este medo insolúvel, aquele fulgor que era um jardim debaixo da geada.
Não há lugar para uma alma enrugada, para um corpo encolhido,
nem mesmo comprimindo seus laços até a mais extrema ofuscação,
recortando as nuvens ao tamanho de algum íntimo sonho perdido no desvão.
Não consigo transpor esta abertura com o pouco que sou.
São supérfluas as mãos e excessivos os pés para esta brecha esquiva.
Sempre sobra um lado como um braço de mar ou o eco se prolonga porque sim,
quando não estorva uma beirada igual que um ornamento sem brilho e sem sentido,
ou sobressai, inquieta, a nostalgia de uma asa.
Não chegarei jamais ao outro lado.

EL OBSTÁCULO (poema original em espanhol)

Es angosta la puerta
y acaso la custodien negros perros hambrientos y guardias como perros,
por más que no se vea sino el espacio alado,
tal vez la muestra en blanco de una vertiginosa dentellada.
Es estrecha e incierta y me corta el camino que promete con cada bienvenida,
con cada centelleo de la anunciación.
No consigo pasar.
Dejaremos para otra vez las grandes migraciones,
el profuso equipaje del insomnio, mi denodada escolta de luz en las tinieblas.
Es difícil nacer al otro lado con toda la marejada en su favor.
Tampoco logro entrar aunque reduzca mi séquito al silencio,
a unos pocos misterios, a un memorial de amor, a mis peores estrellas.
No cabe ni mi sombra entre cada embestida y la pared.
Inútil insistir mientras lleve conmigo mi envoltorio de posesiones transparentes,
este insoluble miedo, aquel fulgor que fue un jardín debajo de la escarcha.
No hay lugar para un alma replegada, para un cuerpo encogido,
ni siquiera comprimiendo sus lazos hasta la más extrema ofuscación,
recortando las nubes al tamaño de algún ínfimo sueno perdido en el desván.
No puedo trasponer esta abertura con lo poco que soy.
Son superfluas las manos y excesivos los pies para esta brecha esquiva.
Siempre sobra un costado como un brazo de mar o el eco que se prolonga porque sí,
cuando no estorba un borde igual que un ornamento sin brillo y sin sentido,
o sobresale, inquieta, la nostalgia de un ala.
No llegaré jamás al otro lado.

Olga Orozco (1920-1999), poetisa argentina.

Imagem: Patagônia argentina, voo de gaivotas.
 
Autor
AjAraujo
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