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Quando eu morrer

 
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Quando eu morrer
Me pesará a terra
E não serei
Qualquer coisa
Diferente
De seixos e pedras.

Quando eu morrer
Não sentirei mais
Qualquer carência
E ainda serei matéria,
Vida
A segregar
Purulenta.

Quando eu morrer
Não sentirei
Qualquer necessidade,
Serei apenas
A verdade plena
Da caveira.

Quando eu morrer
Deixarei de ser
O que sou:
Eu, indivíduo,
Ser fechado
E descontínuo
Para me tornar
Inorgânico
Ao todo reunido.

Quando eu morrer
Nada importará,
Quem sou,
Quem fui,
Se vivi entre amigos
Ou feras,
Se fui luz
Ou se fui treva.

Quando eu morrer
Ninguém me pesará
Para saber
Se pesei
Ou se fui leve,

Se cri
Ou se sofri,
Se neguei
E fui feliz,

Se fui algo
Além
Desse ser
Que vela,
Espera
E diz amém.

Quando eu morrer,
Certo torpor
Sentirei,
Nuvens minha vista
Nublarão
E, enfim,
Irromperei
Na escuridão.

Quando eu morrer
Nada verei,
E de tanta vida e beleza.
Não conservarei
Qualquer promessa,

O rosto vão das certezas,
O fogo da juventude
Que nos inflama
E ilude,
O gozo e a chama
Desse corpo
De vicissitudes
Que chora e ama.

Quando eu morrer,
Nada verei,
Nenhum senhor ou rei,
Prato, juiz
Que pesa e condena,

Serei defunto, matéria
Que não revela
Se vivi parco
Ou deveras,

Se fui fraco
Ou se fui forte,
Mas apenas
Que, efeméride,
Ensaiei breve ato
Para a morte.

Quando eu morrer
Qualquer coisa serei
Que não se pesa,
Algo mudo, inerte
Para alguém que reza
E acende uma vela.

 
Autor
Felipe Mendonça
 
Texto
Data
Leituras
1955
Favoritos
3
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Enviado por Tópico
UsuarioZWT
Publicado: 24/12/2013 19:52  Atualizado: 24/12/2013 19:52
Muito Participativo
Usuário desde: 02/08/2013
Localidade:
Mensagens: 61
 Re: Quando eu morrer
Que maravilha de poema! Apresentou as mesmas concepções que também possuo com relação a morte. Somos um nada, e depois de morrer, continuaremos nada. Muito bem escrito, é raro poemas deste estilo aqui, e com tamanha lucidez para um assunto, que para muitos, é complicado.

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 24/12/2013 21:19  Atualizado: 24/12/2013 21:19
 Re: Quando eu morrer
No que diz respeito a literatura pura e simples, um texto muito bom, com idéias muito bem costuradas e uma condução muito "jóia". Porem e, isso é algo inerente a mim, no que diz respeito a espiritualidade, discordo de alguns pontos...mas isso se deve em função de como eu vejo essa questão de vida e de morte.


Abraços - Pedro

Enviado por Tópico
Vania Lopez
Publicado: 25/12/2013 01:16  Atualizado: 25/12/2013 01:16
Membro de honra
Usuário desde: 25/01/2009
Localidade: Pouso Alegre - MG
Mensagens: 18598
 Re: Quando eu morrer
favoritei imediatamente.
fora esse presente de poema (que aqui recebi)
por sua generosidade em compartilhar.
vim lhe desejar um Feliz Natal. (tudo de bom)

Enviado por Tópico
andrealbuquerque
Publicado: 25/12/2013 11:14  Atualizado: 25/12/2013 11:14
Da casa!
Usuário desde: 18/12/2011
Localidade: Brasil
Mensagens: 325
 Re: Quando eu morrer
Parabéns, Felipe.O retorno á essência, no eterno ciclo da vida.

Enviado por Tópico
Srimilton
Publicado: 25/12/2013 16:30  Atualizado: 25/12/2013 16:30
Membro de honra
Usuário desde: 15/02/2013
Localidade: Nenhuma
Mensagens: 1830
 Re: Quando eu morrer
Felipe,

apesar do meu viés reencarnacionista,
apesar da minha esperança no futuro e, portanto,
na sobrevivência da individualidade, gostei muito desse poema.
Boas festas!

Um abraço!

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 25/12/2013 22:24  Atualizado: 25/12/2013 22:24
 Re: Quando eu morrer
Um belo poema.
Parabéns!

DM

Enviado por Tópico
Felipe Mendonça
Publicado: 26/12/2013 13:53  Atualizado: 26/12/2013 13:53
Usuário desde: 01/12/2011
Localidade: Rio de Janeiro
Mensagens: 541
 Re: Quando eu morrer
Olá, amigos. Obrigado pelas leituras e comentários. Grande abraço a todos.

Enviado por Tópico
visitante
Publicado: 26/12/2013 14:21  Atualizado: 26/12/2013 14:21
 Re: Quando eu morrer
Gostei. Bonito seu poema que pode e deve
ser usado e entendido no plural.

Enviado por Tópico
Jovina
Publicado: 26/12/2013 15:04  Atualizado: 26/12/2013 15:04
Colaborador
Usuário desde: 23/09/2012
Localidade: Salvador
Mensagens: 537
 Re: Quando eu morrer
Se o viver já é passível de solidão, no morrer
ela é infinita pois, abre-se o grande vazio do
Imensurável, do esquecimento.Afinal, é a vida
o maior de todos os desejos.

Enviado por Tópico
Margô_T
Publicado: 17/07/2016 09:50  Atualizado: 17/07/2016 09:50
Da casa!
Usuário desde: 27/06/2016
Localidade: Lisboa
Mensagens: 308
 Re: Quando eu morrer
Um poema cheio de ritmo, apesar de todo ele se desenvolver sobre um tempo sem fôlego.
A repetição do verso “Quando eu morrer” e do “Se” nos primeiros versos das estrofes criam este modo alucinante de nos pegares a este tema de um modo tão intenso.
Entre divagações filosóficas sobre essa “Qualquer coisa” que se será
que não será “Diferente/De seixos e pedras”, “Algo mudo, inerte”
passa-se para uma vertente mais irónica onde se menciona que
“Não sentirei mais/Qualquer carência”, “Deixarei de ser/(…)Ser fechado/E descontínuo/Para me tornar/Inorgânico/Ao todo reunido.”
sem esquecer que
“Nada importará,/(…)Se fui luz/Ou se fui treva”, “Se cri/(…)Se neguei”, “Se vivi parco/Ou deveras”
porque
“Nada verei,/ Nenhum senhor ou rei,/Prato, juiz/Que pesa e condena”
havendo, ainda, espaço para referir que aquilo a que damos importância na vida também desaparecerá
“Não conservarei/qualquer promessa”
bem como “O gozo e a chama”.

Destaco este trecho que, pela sua força de intermitência:
“Certo torpor/Sentirei,/Nuvens minha vista/Nublarão/E, enfim,/Irromperei/Na escuridão.”

Um poema forte de imagens e mensagem.